Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
94/17.0T8BGC.G1
Relator: ROSÁLIA CUNHA
Descritores: ACIDENTE MORTAL
ACÇÃO DE INDEMNIZAÇÃO
PRESCRIÇÃO
ILÍCITO CRIMINAL
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/18/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I – O prazo de prescrição para exercício do direito de indemnização é de três anos, conforme estabelecido no art. 498º, nº 1, do CC.
II – Porém, se o facto ilícito constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo, é este o prazo aplicável (art. 498º, nº 3, do CC), não dependendo esta extensão do prazo de prescrição de o processo penal ter sido, ou vir a ser, iniciado ou de ter sido arquivado, de o crime ter sido amnistiado, ou de não ter sido exercido tempestivamente o direito de queixa.
III - Mas, para que se possa aplicar o prazo de prescrição mais longo do ilícito criminal nos termos referidos no art. 498º, nº 3, do CC, não basta que os factos sejam abstratamente integráveis num tipo de ilícito criminal, sendo necessário que a factualidade concretamente provada possa ser subsumida à prática de um ilícito criminal.
IV – Uma vez que a factualidade provada no caso concreto não permite subsumir a conduta das rés à prática de qualquer ilícito criminal, designadamente do crime de violação de regras de segurança previsto no art. 152º-B, do Código Penal, o prazo de prescrição aplicável é o de três anos, previsto no nº 1 do art. 493º do Código Civil, e não o prazo alargado previsto no nº 3 do mesmo normativo.
Decisão Texto Integral:
Acordam na 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães

RELATÓRIO

AA, BB e CC vieram instaurar, em 19.1.2017, ação declarativa com processo comum contra EMP01..., S.A., EMP02..., S.A., EMP03..., S.A., EMP04... ACE e EMP05..., PRÉ-FABRICAÇÃO, S.A., pedindo que seja declarado que os autores, conjuntamente com a filha DD, são os únicos e universais herdeiros do falecido EE e que as rés  sejam solidariamente condenadas a pagar aos autores as quantias discriminadas na p.i., no valor global de € 263 564,89, acrescido de juros, calculados à taxa legal, desde a citação até efetivo pagamento .

Como fundamento dos seus pedidos alegaram, em síntese, factos tendentes a demonstrar que as rés estão constituídas na obrigação de indemnizar os danos peticionados porquanto EE, marido e pai dos autores, faleceu em consequência de, em ../../2012, ter sido atingido por um apoio provisório, quando trabalhava na construção da obra de arte na AE 4.
O acidente em questão ocorreu porque o apoio provisório, que pesa 150 kg, foi atirado diretamente para o solo de uma altura de 35 metros pelos trabalhadores que efetuaram a sua retirada, em flagrante violação das regras de segurança.
A ré EMP01..., S. A. era a entidade empregadora do falecido, a ré EMP03... era a dona da obra, a ré EMP04... ACE era a empreiteira geral da obra e a Ré EMP05..., Pré-fabricação, S. A., era subempreiteira da mesma obra.
Todas eram responsáveis pelo plano de segurança da obra e pela sua fiscalização.
 
A ré EMP02..., S. A. era seguradora da ré EMP01..., S. A. e da Ré EMP04... ACE.
Pretendem obter indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos em consequência da morte de EE, na parte em que os mesmos extravasam os danos já indemnizados no âmbito do processo de acidente de trabalho.
Referem expressamente que, embora tenham discriminado valores parcelares, apenas o fizeram a título exemplificativo e o que pretendem é que o Tribunal arbitre valores indemnizatórios considerando o valor global e não os valores parcelares.
Só intentaram a ação em 19.1.2017 porque só tiveram conhecimento da versão judicial das concretas circunstâncias do evento que vitimou o falecido EE através do despacho de arquivamento do processo Crime/Inquérito 154/12...., ocorrido mediante a notificação datada de 11.2.2016.
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A ré EMP04... ACE contestou e impugnou parte da factualidade invocada pelos autores.
Invocou a prescrição do direito dos autores e negou que o acidente tenha ocorrido devido a violação de regras de segurança e prevenção de acidentes de trabalho, pelo que defendeu que a ação deve ser julgada improcedente.
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A ré EMP03..., S.A. contestou e impugnou parte da factualidade invocada pelos autores.
Invocou a prescrição do direito dos autores assim como as exceções de ilegitimidade passiva e de autoridade de caso julgado, requerendo a sua absolvição da instância.
Negou que o acidente tenha ocorrido devido a violação de regras de segurança e prevenção de acidentes de trabalho, pelo que defendeu que a ação deve ser julgada improcedente.
Deduziu incidente de intervenção principal provocada da Companhia de Seguros EMP06....
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A ré EMP05..., PRÉ-FABRICAÇÃO, S.A. contestou e impugnou parte da factualidade invocada pelos autores.
Invocou a prescrição do direito dos autores.
Negou que o acidente tenha ocorrido devido a violação de regras de segurança e prevenção de acidentes de trabalho, pelo que defendeu que a ação deve ser julgada improcedente.
Deduziu incidente de intervenção principal provocada da EMP07....
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A ré EMP01..., S.A. contestou e impugnou parte da factualidade invocada pelos autores.
Invocou a prescrição do direito dos autores.
Alegou que o falecido EE, à data do sinistro, não se encontrava ao seu serviço visto ter sido cedido à EMP04... ACE, pelo que não pode ser responsabilizada pelo pagamento de qualquer indemnização.
Negou que o acidente tenha ocorrido devido a violação de regras de segurança e prevenção de acidentes de trabalho.
Concluiu que a ação deve ser julgada improcedente.
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Foi admitida a intervenção acessória da Companhia de Seguros EMP06... e da EMP07....
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A COMPANHIA DE SEGUROS EMP06... contestou e impugnou parte da factualidade invocada pelos autores.
Deduziu a exceção de incompetência material do tribunal para apreciar a presente ação.
Invocou a prescrição do direito dos autores.
Alegou que, de acordo com a apólice de seguro, a sua responsabilidade se encontra limitada ao período de vigência da apólice e aos dois anos posteriores à sua anulação. Como a indemnização não foi reclamada nesse período temporal, entende que não tem qualquer responsabilidade pelo seu pagamento.
Por outro lado, a apólice exclui os danos sofridos na sequência de acidente de trabalho, situação em que se enquadra o acidente que vitimou o falecido EE.
Acresce que o falecido não era trabalhador da sua segurada, pelo que, também por este motivo, estaria excluído do âmbito de cobertura da apólice.
Concluiu que a ação deve ser julgada improcedente.
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A EMP07... contestou e impugnou parte da factualidade invocada pelos autores.
Alegou que o sinistro não se encontra coberto pela apólice de seguro, pois tratou-se de um acidente de trabalho.
Invocou a prescrição do direito dos autores.
Concluiu que a ação deve ser julgada improcedente.
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Realizou-se a audiência prévia e, após, foi proferido despacho que:

a) julgou improcedente a exceção de incompetência material do tribunal;
b) julgou improcedente a exceção de ilegitimidade deduzida pela ré EMP03...;
c) considerou tabelarmente verificados os demais pressupostos processuais;
d) julgou improcedente a exceção de autoridade de caso julgado deduzida pela ré EMP03...;
e) relegou para a decisão final o conhecimento da exceção de prescrição;
f) fixou à causa o valor de € 263 564,98;
g) identificou o objeto do litígio e enunciou os temas da prova;
h) apreciou os requerimentos probatórios apresentados e designou data para a realização da audiência final.
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Realizou-se a audiência final.
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Em 2.9.2019 foi proferida decisão que julgou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide relativamente à ré insolvente EMP05..., Pré-Fabricação, S.A.
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Foi proferida sentença com o seguinte teor decisório:

Pelo exposto, julgo parcialmente procedente a presente acção e, em consequência:
Absolvo os Autores da alegada excepção de prescrição;
Declaro extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide, relativamente à interveniente acessória EMP07... Companhia de Seguros, S. A..
Declaro que os Autores são, conjuntamente com a filha DD, os únicos e universais herdeiros do falecido EE;
Condeno as Rés EMP03..., S. A. e EMP04... ACE a pagar aos Autores, solidariamente, a quantia de € 125 000, 00 (cento e vinte e cinco mil euros) e a quantia de € 220 000, 00 (duzentos e vinte mil euros), deduzida do valor global a pagar pela EMP02... , S. A., no âmbito da conciliação laboral, até ao limite de € 133 564,89 (cento e trinta e três mil quinhentos e sessenta e quatro euros e oitenta e nove cêntimos), acrescidas esta quantia de juros de mora à taxa legal, a contar da citação, e a quantia de € 125 000, 00, a contar da prolação da sentença, até efectivo e integral pagamento;
Absolvo as Rés EMP03..., S. A. e EMP04... ACE do demais peticionado; e, as Rés EMP01..., S. A. e EMP02..., S. A., do pedido.
Custas a cargo dos Autores e das Rés EMP03..., S. A. e EMP04... ACE, na proporção do decaimento (cf. artigo 527.º, números 1 e 2, do C. P. Civil).
Registe e notifique.”
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A COMPANHIA DE SEGUROS EMP06... S.A. não se conformou e interpôs o presente recurso de apelação, tendo terminado as suas alegações com as seguintes conclusões:

1. O interesse da Interveniente Acessória em recorrer da sentença recorrida, que condena as Rés/seguradas EMP04... e EMP03..., decorre da sucumbência destas nos presentes autos, na medida em que tal sucumbência será a medida, pressuposto e fundamento do direito de reembolso que estas, ao chamar a seguradora a intervir nos autos, declararam pretender exercer em acção ulterior, nos termos do art.º 323º, n.4 do CPC.
2. Nos termos dos art.ºs 631º, n.º1 e 2 do CPC e 20º da CRP e dos critérios jurisprudenciais maioritários sobre a questão da legitimidade do interveniente acessório para recorrer -por todos, Acórdão da Relação de Coimbra, de 20-12-2016, Proc. 359/15.5T8SRT.C1 e o recente acórdão do STJ, de 31-03-2022, Proc. 812/06.1TBAMT.P1.S1 – resultando da sentença recorrida a condenação das Rés/Seguradas da Recorrente, esta tem legitimidade para interpor o presente recurso, requerendo a reapreciação da decisão recorrida e da sucumbência dela decorrente, que será medida e pressuposto do direito de reembolso a exercer contra ela em acção ulterior, ao abrigo da cobertura do contrato de seguro a que aludem os Factos Provados n.ºs 45 e 46 da sentença recorrida.
3. Como decorre sem margem para dúvidas do art,º 31º, 32º e 35º e 37º da Petição Inicial (PI), nada foi alegado e/ou peticionado a título de “falta de contribuição para o sustento” do 4ºA/CC, pelo que a sentença recorrida ao atribuir a este o valor de 20.000,00 Eur por perda de alimentos, condenou além do pedido e, como tal, nessa parte a sentença é nula, devendo ser revogada a condenação das Rés nesse valor ao 2ºAutor/Recorrido, nos termos do art.º 609º, n.º1 do CPC.
4. O Tribunal recorrido fundamenta a condenação das Rés/Seguradas no incumprimento do dever de prevenir o perigo previsto no art.º 160.º do Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil e na consequente violação artigos 5.º, n.º 2, e 3, 7.º, alínea a), e 17.º, alínea b), 20.º e 22.º, n.º 1, alínea a), do Decreto-lei n.º 273/2003, na medida em que considerou que não consta dos factos provados que “os trabalhadores tivessem sido advertidos de que não podiam arremessar os aparelhos provisórios directamente ao solo e fossem vigiados para que tal não ocorresse.”
5. Trata-se de questão que nunca foi especificamente alegada nos autos, em particular pelos Recorridos, a quem, nos termos do art.º 342º do C.Civil, cabia o ónus de alegação e prova da factualidade que pudesse sustentar a alegação, meramente conclusiva, de que o acidente ficou a dever-se a “uma flagrante violação das regras de segurança e de prevenção de acidentes” de segurança e de prevenção de acidentes” – art.º 21º e 26º da PI.
6. Como resulta dos docs...., ... e ... junto com a contestação da Ré EMP03..., o Tribunal recorrido foi mais longe que a própria ACT e, apenas em sede de sentença, descortinou a tal violação do dever de advertir os trabalhadores, de que os aparelhos provisórios não podiam ser arremessados directamente para o chão, e de os vigiar para que tal não acontecesse, para assim justificar a procedência da acção.
7. Estamos perante uma decisão surpresa, que enferma de nulidade a sentença recorrida, subsumível no na alínea d), n.º1, do art.º 615º do CPC, apenas invocável em sede de recurso da mesma sentença (cf. nesse sentido Prof. Miguel Teixeira de Sousa, Blog do IPPC, 29-11-2016, Jurisprudência (496) Decisão-surpresa; nulidade; investigação da paternidade; caducidade, disponível em https://blogippc.blogspot.com/2016/11/jurisprudencia-496_29.html).
8. O que aqui expressamente se invoca, para os devidos e legais efeitos, porquanto a sentença recorrida é nula, na parte em que fundamenta a responsabilidade das Rés/Seguradas em questão de facto e de direito nunca antes alegada e/ou discutida nos  autos, pelo que se impõem a sua revogação e consequente absolvição das rés dos pedidos formulados nos autos.
9. Sem margem para dúvidas, resulta da prova testemunhal, mas essencialmente documental junta aos autos (doc.... da Petição Inicial, auto de conciliação por acidente de trabalho; doc..../auto de contraordenação da ACT e doc.... e .../decisão que julgou totalmente improcedente aquela contraordenação da contestação da EMP03...;doc. .../auto de mão de obra n.º 36, junto com a contestação da Ré EMP01...), que o trabalhador FF, à data do acidente que o vitimou, embora estivesse a trabalhar “sob as ordens, direção e fiscalização da Ré EMP04... no exercício das suas funções de carpinteiro de tosco e encarregado, com isenção de horário de trabalho” (Facto Provado n.º2), estava vinculado por contrato de trabalho à Ré EMP01....
10. E foi precisamente na qualidade de entidade empregadora, que a Ré EMP01..., na qualidade de empresa cedente, celebrou um acordo de cedência temporária e que “na sequência do mencionado acordo de cedência ocasional, a EMP01... facturou ao EMP04... o valor correspondente a tais cedências de trabalhadores (…) onde consta, expressamente, como trabalhador cedido (cedência temporária) desde o dia ../../2011, o sinistrado EE (…)”.– cfr. pág. 11/41 da sentença recorrida.
11. Estamos perante um facto - relação laboral entre a vítima/trabalhador e a Ré EMP01.../Empregadora – sobejamente provado pela prova documental junto aos autos e que importa à boa decisão da causa, em particular, para apurar a responsabilidade solidária da entidade empregadora, enquanto empresa cedente, nos termos do art.º 18º da LAT.
12. Pelo que importa aditar tal facto à factualidade provada da sentença recorrida, completando-se o Facto Provado n.º2, sugerindo-se para o efeito a seguinte redação: “2.º
- No dia ../../2012, o referido EE sofreu um acidente, quando, em ..., no viaduto sobre a E.N. ...5, no IP..., trabalhava sob as ordens, direção e fiscalização da Ré EMP04... no exercício das suas funções de carpinteiro de tosco e encarregado, com isenção de horário de trabalho, a quem tinha sido cedido pela sua entidade empregadora, a EMP01... S.A., no âmbito de um acordo de cedência temporária de trabalhadores, celebrado entre as duas empresas.”
13. Tal como se consigna na fundamentação da sentença recorrida, “a morte do infeliz EE resultou de ter sido atingido por um dos aparelhos provisórios que os trabalhadores da EMP05..., Pré- Fabricação, S. A. atiraram directamente para o solo, desde a plataforma onde executavam os trabalhos de remoção dos aparelhos, (…).” – pág. 22/41 da sentença.
14. Para que a eclosão do acidente ocorrido em sede laboral possa ser atribuída à violação de regras de segurança pelo empregador, ou pessoa responsável pelo seu cumprimento, é necessário que se verifique a violação de uma regra ou norma concreta sobre segurança no trabalho, não bastando a violação de regras genéricas ou programáticas sobre esta segurança, para que se dê como preenchida a previsão do nº 1 do artº 18º da LAT ou até o tipo legal de crime p.p. no art.º artigo 152.º-B, n.ºs 1, 2 e 4, alínea b), do Código Penal – a título meramente exemplificativo da jurisprudência unânime neste sentido, Acórdão da Relação de Coimbra, de 30-11-2017, Proc. 45/11.5TTCLD.C1.
15. Não existe, e não foi elencada no vasto acervo legislativo em que se fundamenta a sentença recorrida nesta matéria, qualquer norma que, para prevenção do risco previsto no art.º 160º do Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil, obrigue o Empregador a advertir especificamente os trabalhadores de que quaisquer objectos utilizados em trabalhos em altura, serão arriados com cuidado e nunca arremessados directamente, e de os vigiar, para que tal não aconteça.
16. As Rés/Seguradas cumpriram com os deveres que decorrem do art.º, 15º, n.º1 e 2 da Lei 102/2009, identificando e prevenindo os riscos decorrentes da remoção dos apoios em altura, a que alude o art.º 160º do Regulamento da Construção Civil, ao planificarem a organização do trabalho mediante os procedimentos que resultam dos factos provados 12 a 15, de tal maneira que aqueles trabalhos, constituíam “TAREFA SIMPLES E SEM QUALQUER RISCO, SE EFETUADA COM OBSERVÂNCIA DAS REGRAS A QUE TAL TRABALHO ESTAVA SUJEITO”. – Facto Provado n.º 16 – assim “combatendo os riscos na sua origem, por forma a eliminar ou reduzir a exposição e aumentar os níveis de protecção (…). – alª. e) do n.º2, art.º 15º da Lei 102/2009.
17. Como está provado, as Rés/Seguradas também cumpriram com o dever de “combater o risco na sua origem, diminuindo a exposição e aumentando a segurança”, elaborando e executando “o Plano Específico de Segurança (“PES”) para Montagem de Estruturas Pré- Fabricadas para Tabuleiros (Vigas e Pré-Lajes) – OAE’s, bem como as Fichas de Prevenção de Riscos FPR023A02 (Movimentação Manual de Cargas) e FPR028A02 (Movimentação Mecânica de Cargas)” (Facto Provado n.º47), que distribuíram à Ré EMP05..., ao serviço de quem se encontravam os trabalhadores que removeram o apoio que atingiu a vítima, entidade “a quem cabia proceder à respectiva divulgação pelos seus colaboradores e subempreiteiros, conforme consta dos Comprovativos de Distribuição, assinados, respectivamente, a 18 de Agosto de 2010 e a
17 de Novembro de 2011.” (Factos Provados n.ºs 48 e 49).
18. Mas as Rés/Seguradas não se bastaram com a divulgação dos planos de segurança e execução dos trabalhos, já que “para além da referida divulgação obrigatória, todos os trabalhadores afectos à obra em questão foram alvo de formações de acolhimento e específicas, nas quais foram sensibilizados para os vários riscos e precauções envolvidos”. (Factos Provados n.º50 e 51), o que inclui os riscos decorrentes dos trabalhos de movimentação mecânica de carga, como os apoios provisórios removidos em altura, identificados no PPS e Fichas de Prevenção de riscos.
19. Em particular, “houve lugar a diversas formações específicas para a movimentação manual de cargas e para a movimentação mecânica de cargas: em particular, refira-se que os funcionários da EMP05... GG e HH estiveram presentes nas sessões de formação, o primeiro na ocorrida em 19 de Dezembro de 2011 e o segundo nas sessões ocorridas em 19 de Dezembro de 2011 e 30 de Dezembro de 2011.” (Facto Provado n.º52).
20. Foi ainda assegurado que “o PSS, o PES e as Fichas de Prevenção de Riscos Relativas à Movimentação Manual de Cargas e à Movimentação Mecânica de Cargas foram entregues ao trabalhador sinistrado (Sr. EE), bem como aos trabalhadores envolvidos nos trabalhos de remoção manual dos apoios provisórios (trabalhos que, como vimos, estavam em execução na altura do acidente).” (Facto Provado n.º53).
21. Importa ainda realçar que “o trabalhador sinistrado e os trabalhadores que procediam aos trabalhos de remoção manual dos apoios provisórios – assim como todos os restantes – estavam  perfeitamente cientes das obrigações decorrentes da necessidade de assegurar, a todo o tempo, o cumprimento do plano de segurança”, no qual se  enquadravam os procedimentos de remoção de apoios, o que “CONSTITUÍA TAREFA SIMPLES E SEM QUALQUER RISCO, SE EFETUADA COM OBSERVÂNCIA DAS REGRAS A QUE TAL TRABALHO ESTAVA SUJEITO”. – (Facto Provado n.º16) – o que era ainda assegurado por mecanismos de segurança na plataforma dos trabalhos de remoção dos apoios, que “dispunha de guarda corpos, mas também de rodapés, destinados a evitar a queda de materiais pousados nessa plataforma” (Facto Provado n.º.56).
22. Perante toda esta factualidade provada e que integra a sentença recorrida, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao fundamentar a responsabilidade das Rés/Seguradas, por terem omitido o dever de evitarem o risco previsto no art.º 160º do RCC, ao não terem cumprido com um especifico dever de advertência e vigilância dos trabalhadores, na remoção dos apoios provisórios em altura.
23. O acidente que vitimou o pai e marido dos Recorridos não ficou a dever-se à violação (por omissão) das regras de segurança pelas Rés/Seguradas, ou porque, como conclui o Tribunal a quo, “não teria ocorrido, se os trabalhadores tivessem sido advertidos de que não podiam arremessar os aparelhos provisórios directamente ao solo e fossem vigiados para que talnão ocorresse”. – pág. 34/41 sentença recorrida.
24. Bem pelo contrário: o acidente em causa ficou a dever-se à violação, sem causa justificativa, das regras de segurança previstas e implantadas na obra e a que estava sujeito o trabalho em curso (Facto Provado 16), pelos trabalhadores da EMP05..., que executavam a tarefa de remoção dos apoios provisórios, motivados pelo facto de que “era sexta-feira, o chefe II não estava na obra, acabado o trabalho de remoção dos aparelhos, não havia outros trabalhos para realizar, pelo que, se fossem rápidos, poderiam ir de fim-de-semana e almoçar a casa (cf. depoimento da testemunha II)”. – sic sentença recorrida.
25. Fizeram-no com culpa e conscientes de que violavam as normas de segurança impostas para a execução da tarefa que tinham em curso, já que “o trabalhador sinistrado e os TRABALHADORES QUE PROCEDIAM AOS TRABALHOS DE REMOÇÃO MANUAL DOS APOIOS PROVISÓRIOS – ASSIM COMO TODOS OS RESTANTES – ESTAVAM PERFEITAMENTE CIENTES DAS OBRIGAÇÕES DECORRENTES DA NECESSIDADE DE ASSEGURAR, A TODO O TEMPO, O CUMPRIMENTO DO PLANO DE SEGURANÇA.” (Facto Provado n.º 54, nosso sublinhado).
26. Concorreu também para a eclosão do acidente a culpa da vítima, o Sr. EE, que exercia as funções de Encarregado da obra (Facto Provado n.º2), a quem “O PSS, o PES e as Fichas de Prevenção de Riscos Relativas à Movimentação Manual de Cargas e à Movimentação Mecânica de Cargas foram entregues ao trabalhador sinistrado (Sr. EE), bem como aos trabalhadores envolvidos nos trabalhos de remoção manual dos apoios provisórios (trabalhos que, como vimos, estavam em execução na altura do acidente).” (Facto Provado n.º 53).
27. Estando provado também que estava “(…) perfeitamente cientes das obrigações decorrentes da necessidade de assegurar, a todo o tempo, o cumprimento do plano de segurança” (Facto Provado n.º54), nomeadamente e ao que agora importa, “Impedir a circulação de pessoas e equipamentos debaixo de cargas suspensas”. (Factos Provados 41 e 42).
28. E porque estavam em curso trabalhos de remoção de apoios provisórios em altura, foi implementada a medida de segurança prevista para evitar os riscos daí decorrentes, já que  “o acesso/circulação na parte da obra em apreço estava condicionado por PMB (Perfis Móveis de  Betão), redes Bekaert e sinalização, só havendo entrada com autorização dos encarregados” (Facto Provado n.º43), como era o caso da vítima.
29. O nosso ordenamento jurídico, no art.º 563º do C. Civil consagra a teoria da causalidade adequada na sua formulação negativa, ou seja, perante tal entendimento, é necessário demonstrar que, se tivessem sido adoptadas as medidas de prevenção/segurança implementadas na obra pelas Rés/Seguradas, o acidente não teria ocorrido.
30. O que resulta provado nos autos, já que se o apoio provisório tivesse sido removido conforme as regras a que tal trabalho estava sujeito, era uma tarefa simples e segura (Facto n.º16), teria sido removido por via da utilização da grua (Factos Provados 12 a 15) e nunca teria sido arremessado manualmente e directamente para o chão, a partir de uma altura de 35 metros.
31. Por outro lado, se a vítima, o Sr. EE, não estivesse a circular no local onde foi atingido pelo apoio provisório, numa zona cujo acesso estava vedado por obstáculos e sinalização, que necessariamente teve de transpor para aceder ao local do acidente, em total violação das normas de segurança previstas, informadas e implementadas na altura do acidente  (Facto Provado n.º 42 e 43),
32. e que integravam o Plano de Segurança e Saúde em obra, o Plano Específico de Segurança: “Montagem de Estruturas Pré-Fabricadas para Tabuleiros (Vigas e Pré-Lajes) e na Ficha de Prevenção de Riscos (FPR 369-A) do Plano (Factos Provados 40º a 42º), o acidente que o vitimou não teria ocorrido, assim também contribuindo com culpa sua para a ocorrência do acidente que o vitimou.
33. Assim, em obediência à boa aplicação do art.º 563º do C. Civil e da teoria da causalidade adequada na sua formulação negativa, impõem-se rectificar o entendimento que enferma de erro de julgamento, vertido na sentença recorrida, concluindo-se antes que o acidente não teria ocorrido, se os trabalhadores da EMP05... e a vítima mortal tivessem cumprido com as normas de segurança que foram implementadas na obra.
34. A actuação das Rés/Seguradas não é subsumível no nº 1 do artº 18º da LAT (Lei 98/2009, de 04/09), nem na previsão do tipo legal de crime p.p. no art.º 152.º-B, n.ºs 1, 2 e 4, alínea b), do Código Penal, já que da matéria de facto provada nos autos não resulta que tenham violado uma regra ou norma concreta sobre segurança no trabalho e, por outro lado, resulta que o acidente dos autos ocorreu precisamente por não terem sido respeitadas as normas de segurança implementadas na obra, pelos trabalhadores da EMP05... e pela própria vítima.
35. Concluindo-se, assim, pela PRESCRIÇÃO DO DIREITO DOS RECORRIDOS, já que não tendo ocorrido a violação de normas de segurança pelas Rés/Seguradas, não se justifica a aplicação do prazo de prescrição de 10 anos, por não se verificar qualquer acção integradora do tipo legal de crime p.p. no art.º. 152.º-B, n.ºs 1, 2 e 4, alínea b), do Código Penal, sendo aplicável o prazo de 3 anos, previsto no art.º 498º, n.º1 do C. Civil, há muito esgotado quando concretizada a citação das Rés/Seguradas, por ofícios de citação de 13/02/2017.
36. Nesta matéria o Tribunal recorrido também foi além do alegado pelos Recorridos, que não invocaram factos suceptiveis de, especificamente, integrarem qualquer tipo legal de crime, que pudesse fundamentar a aplicação de prazo de prescrição mais longo, nos termos do artº. 498º, n.º3 do C. Civil, pelo que, também por essa razão, o prazo de prescrição a considerar é o de 3 anos, previsto no n.º1 daquela norma.
37. O que expressamente se invoca para os devidos e legais efeitos, impondo-se a imediata absolvição das Rés/Seguradas dos pedidos, nos termos do art.º 576º, n.º3 do CPC. Quando assim não se julgar,
38. Ao julgar a acção parcialmente procedente, o Tribunal recorrido fez má aplicação do direito à factualidade que resulta provada na sentença recorrida, nomeadamente, dos art.º 18º, n.º1 da LAT e art.º 152.º-B, n.ºs 1, 2 e 4, alínea b), do C.P., 160.º do Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil, bem como das normas previstas nos artigos 483º, 486º, 563º e 570º do C. Civil, incorrendo em erro de julgamento, ao invocar e subsumir a factualidade provada na previsão das normas citadas na sentença recorrida, assim se impondo a absolvição das Rés/seguradas dos pedidos contra elas formulados, julgando-se em relação a estas a acção totalmente improcedente.
39. Os Recorridos sustentam a sua pretensão contra TODAS as Rés, invocando apenas a violação de regras de segurança no trabalho e, consequentemente, convocam APENAS o art.º 18º da LAT, sem nunca invocarem outras normas ou fontes de responsabilidade de natureza civil, como seria a responsabilidade civil extracontratual da dona da obra – cfr. art.º 26º da PI.
40. No entanto, a sentença recorrida justifica a condenação Ré EMP03..., enquanto dona da obra, “nos termos gerais, pela inobservância dos seus deveres de planeamento da segurança e fiscalização (vide acórdão do STJ de 09-07-2015, proferido na Revista n.º 102/05.7TVLSB.E1.S1, em parte citado no acórdão do STJ de 22-06-2021, in sítio da Net do IGFEJ), nos termos do disposto nos artigos 483.º e 486.º do Código Civil”. – cfr. sentença recorrida.
41. Mais uma vez e com o devido respeito, se afigura que a sentença recorrida padece de nulidade, ao condenar em objecto diferente do pedido e ao conhecer de questão que não foi suscitada, já que os Recorridos não deduziram nenhuma pretensão contra a Dona da Obra nos termos gerais, suscitando a questão da violação do dever de vigilância que decorre do art.º 1209º do C. Civil, pela inobservância dos seus deveres de planeamento da segurança e fiscalização, mas apenas fundamentaram a sua pretensão na violação de regras de segurança no trabalho e no art.º 18º, n.º1 da LAT.
42. O Tribunal recorrido não podia condenar a dona da obra nos termos gerais da responsabilidade civil extracontratual, pela inobservância dos seus deveres de planeamento da segurança e fiscalização, como resulta da sentença recorrida, pelo que não podendo fundamentar-se a condenação da EMP03... ao abrigo doart.º 18º, n.º1 da LAT, como peticionado, impõem-se a sua imediata absolvição do pedido.
43. Sem prescindir, dos factos provados nos n.ºs 12 a 16, 38 a 43 e 47 a 56 da sentença recorrida, conclui-se que a Dona da Obra cumpriu com os deveres de controle, direcção e supervisão técnica da obra, empregando todas providências exigidas pelas circunstâncias, para prevenir o risco dos trabalhos em altura, ficando o acidente a dever-se à violação das regras de segurança implementadas na obra pelos trabalhadores da EMP05... e pela vítima.
44. Apesar de se encontrar cedido temporariamente à EMP04..., para trabalhar “sob as ordens, direção e fiscalização da Ré EMP04... no exercício das suas funções de carpinteiro de tosco e encarregado, com isenção de horário de trabalho” (Facto Provado n.º2), a vítima EE era trabalhador e estava vinculado à Ré EMP01..., por via de um contrato de trabalho celebrado entre ambos.
45. Concluindo o Tribunal recorrido que o acidente que vitimou um trabalhador da Ré EMP01..., cedido temporariamente à EMP04..., ocorreu por ter sido violado (por omissão) o dever de assegurar as regras de segurança no trabalho, então impunha-se igualmente a condenação, solidária, da entidade empregadora/empresa cedente do trabalhador vitimado pelo acidente dos autos, nos termos do art.º 18º da LAT – neste sentido, acórdão da Relação do Porto, de 20-02-2018, Proc. 295/14.2TTVRL.P1.
46. Ao absolver a Ré Entidade Empregadora da vítima, o Tribunal incorreu em erro de julgamento, fazendo má aplicação do art.º 18º, n.º1 da LAT, pelo que, a manter-se a decisão recorrida – o que se equaciona por dever de patrocínio – impõe-se revogar a sentença recorrida na parte em que absolveu a EMP01... S.A., entidade empregadora e empresa cedente do trabalhador sinistrado, e a sua Seguradora, a Recorrida EMP02..., por outra decisão que condene a EMP01... e a sua seguradora, ao abrigo da cobertura dos contratos de seguro que constam dos Factos Provados n.ºs 29 ou 30, solidariamente, no pagamento de todas as quantias devidas ao Recorridos, o que expressamente se requer.
47. Com base nos Factos Provados no n.º 1 da sentença recorrida, esta no seu dispositivo reconhece, declarando, que “os Autores são, conjuntamente com a filha DD, os únicos e universais herdeiros do falecido EE”.
48. Segundo a doutrina e a jurisprudência hoje dominantes, quando o nº. 2 do artigo 496º do Código Civil diz que o direito à indemnização, por danos não patrimoniais, cabe, "em conjunto", ao cônjuge e aos filhos e outros descendentes, quer significar que estamos perante uma indemnização que cabe por direito próprio a cada uma das pessoas abrangidas pela previsão daquela norma – por todos, cfr. a extensa e profícua argumentação jurídica expendida no Acórdão do STJ, de 09-03-2017, Proc. 582/05.0TASTR.E2.S1.
49. O valor de 60.000,00 Eur fixado na sentença recorrida pelo dano morte da vítima, cabia, assim, em conjunto a TODOS os herdeiros da vítima, incluindo a filha DD que não é Autora nesta acção, pelo que a proporção daquele valor que lhe era devida, por direito próprio e que optou por não exercer, não acresce e não pode ser atribuída aos Recorridos - neste sentido, cfr. o Acórdão da Relação do Porto, de 12-12-2006, Proc.0626394.
50.Assim e como impõe a boa interpretação e aplicação do art.º496º, n.º 2 do C.Civil, segundo  o entendimento jurisprudencial maioritário actual, o valor a atribuir aos Recorridos, em igual proporção, pelo dano morte, há-de ser fixado em 45.000,00Eur (quarenta e cinco mil euros), deduzindo-se ao valor de 60.000,00 Eur já fixado, a proporção de 15.000,00Eur  (60.000,00Eur/4 Herdeiros) que, por direito próprio, cabe à filha e herdeira DD.
51. Como resulta do auto de conciliação junto como doc. ... da PI, no processo por Acidente de Trabalho, que correu termos pelo Tribunal de Trabalho de Penafiel, Proc. 376/12...., foi atribuída uma pensão anual e vitalícia à Viúva e Filho BB e ao Filho CC até atingir 18/22 ou 25 anos, segundo os mesmos critérios a que se atendeu na sentença recorrida para chegar ao valor da indemnização pelo dano patrimonial futuro, ou seja a remuneração de € 965 x 14 + 124, 30 x 11 + 241,25 x 12 : 12 = € 1 481, 025 – Facto Provado n.º2.
52. Tal como se encontra fundamentada a sentença recorrida, fazendo uma concretização da alegação conclusiva que estrutura toda a causa de pedir fundamentada “na flagrante violação das regras de segurança e prevenção de acidentes por parte dos trabalhadores” – art.º 21º da PI – a condenação das Rés/Seguradas sustenta-se na violação (por omissão) das regras de segurança exigíveis na execução dos trabalhos de remoção de apoios provisórios – artigo 160.º do Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil, artigos 5.º, n.º 2 e 3, 7.º, alínea a), 17.º, alínea b), 20.º e 22.º, n.º 1, alínea a) do Decreto-lei n.º 273/2003, 18º, n.º1 da LAT e até o crime p.p. no art.º 152.º-B, n.ºs 1, 2 e 4, alínea b), do Código Penal, para julgar improcedente a excepção da prescrição invocada.
53. Neste contexto, atendendo ao pedido formulado na PI e aos fundamentos a que a sentença recorrida alude para atribuir o valor de 220.000,00 Eur (fundamentos legais e retribuição da vítima considerada), estamos perante a indemnização do mesmo dano já indemnizável em sede laboral, com a atribuição de pensões aos recorridos, por morte da vítima de Acidente de Trabalho.
54. Não sendo devida qualquer indemnização nestes autos, porque não há dano a indemnizar aqui, pois o MESMO DANO - fixado com base nos mesmos pressupostos legais e factuais/remuneração- já foi indemnizado em sede de AT, impondo-se, assim, a absolvição das Rés/Seguradas do pedido nesta parte e no pagamento do valor de 220.000,00Eur, atribuído pelo dano patrimonial futuro decorrente da morte da vítima - em defesa deste entendimento invoca-se a decisão vertida no Acórdão da Relação de Évora,de12-05-2022, Proc. 1956/18.2T8TMR.E1. Sem prescindir,
55. Na sentença recorrida considerou-se o valor da remuneração ilíquida da vítima, resultante do auto de conciliação de Acidente de Trabalho (€ 965 x 14 + 124,30 x 11 + 241,25 x 12 : 12 = €1.481, 025 anuais), para se chegar ao valor de 220.000,00 Eur atribuído por este dano aos Recorridos.
56. Mas para se apurar a indemnização por este dano patrimonial, deve-se atender ao rendimento líquido, pelo que ao valor da remuneração base de 965 Eur x 14 meses terá de se descontar 11% (=106,15Eur), relativo à taxa paga por qualquer trabalhador dependente para a Segurança Social, apurando-se assim o salário líquido de 858,85Eur, do qual a vítima entregaria mensalmente 70% para assegurar despesas do agregado familiar (= 601,19Eur).
57. Seguindo o critério de cálculo da sentença recorrida, nos 283 meses de vida activa da vítima, esta entregaria no final desse período o valor de 170.136,77 Eur, ao qual se deverá deduzir uma percentagem de cerca 10%, que os critérios jurisprudenciais aplicam, considerando que aquele valor vai ser pago de imediato.
58. Se considerarmos a taxa actual média de remuneração dos depósitos a prazo é de cerca 1% ao ano (considerando a taxa de juro média actual para depósitos de particulares é de 0,07%, segundo o Banco de Portugal, in boletim informativo disponível em https://bpstat.bportugal.pt/conteudos/noticias/1722), justifica-se a aplicação de uma redução de 10% do valor que só seria recebido ao fim de 23 anos (durante os quais o valor pode ser anualmente rentabilizado, no mínimo, à taxa anual do juro para depósitos a prazo), assim se apurando o valor final de 153.123,10 Eur (170.136,77 – 10% = 17.013,67/).
59. Mais se deduzindo-se, como já decidido em função do que foi expressamente peticionado pelos Recorridos, os valores que estes efectivamente venham a receber pela pensão arbitrada no processo emergente de Acidente de Trabalho, mas sem o limite máximo de €133 564,89, porquanto, sendo “incertos e não provados os montantes que os Autores irão receber da seguradora responsável pela pensão arbitrada no processo n.º ...12...” – cfr.. sentença recorrida – não se pode fixar um limite máximo, que pode ser ultrapassado, quando tais valores venham a ser especificamente liquidados e pagos aos Recorridos.
60. Nestes termos e nos melhores de direito aplicáveis, invocando-se a boa aplicação das normas legais e dos critérios jurisprudenciais supra enunciados, ou outros melhor aplicáveis, sempre com o douto suprimento de V. Excªs, o presente recurso deve ser julgado procedente, por provado, nos termos supra expostos, revogando-se a sentença recorrida, na parte em que condenou as Rés/Seguradas EMP04... e EMP03..., por douto acórdão que absolva estas entidades Seguradas da Recorrente de todos os pedidos contra elas formulados.
61. Quando assim não se julgar, o que sempre se admite pelo respeito devido por melhor opinião contrária, que se equaciona por dever de patrocínio, a sentença recorrida deve ser revogada na parte em que absolveu a Recorrida EMP01... S.A. e a sua seguradora EMP02..., por douto acórdão que as condene, solidariamente, no pagamento das quantias devidas aos Recorridos, mais se absolvendo e condenando nos termos supra expostos e requeridos,
Assim fazendo V. Exas JUSTIÇA!”
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A EMP02..., S.A. apesentou contra-alegações quanto ao recurso interposto pela Companhia de Seguros EMP06..., S.A., pugnando pela manutenção da decisão recorrida.
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A EMP04..., A.C.E. também não se conformou e interpôs o presente recurso de apelação, tendo terminado as suas alegações com as seguintes conclusões:

“1.ª-     Os presentes autos respeitam a um acidente de trabalho ocorrido em 25.05.2012, que vitimou mortalmente EE, do qual os Autores são herdeiros, quando aquele exercia as funções de encarregado, ao serviço do Apelante, na empreitada de construção da Autoestrada ..., mais concretamente, em ..., no viaduto sobre a E.N. ...5, no IP....
2.ª-      Na sequência do acidente, foi movido pela ACT contra o aqui Apelante um procedimento contraordenacional que culminou com a decisão de aplicação de uma coima, a qual, no entanto, veio a ser revogada pelo Tribunal do Trabalho de Bragança, e correu termos na unidade de Apoio dos Serviços do Ministério Público junto do Tribunal do Trabalho de Penafiel o processo emergente de acidente de trabalho, entre herdeiros do falecido e a seguradora do empregador, que terminou na fase conciliatória, e no qual foram atribuídas, à viúva e a filhos do sinistrado, as indemnizações e pensões previstas nos artigos 59.º, 60.º e 72.º da LAT.
3.ª- O sinistrado encontrava-se dentro de uma viatura junto a um pilar onde a subempreiteira EMP05... desenvolvia os seus trabalhos, numa plataforma situada a cerca de 35 metros de altura do solo, quando um aparelho de apoio provisório de betão, com, pelo menos, 150 kg de peso, vindo dessa plataforma, atingiu o tejadilho daquela, amassando-o contra a cabeça do sinistrado e causando-lhe lesões que provocaram a sua morte.
4.ª-  Os dois trabalhadores da EMP05... que procediam à tarefa de remoção manual dos apoios provisórios do local onde se encontravam até ao pavimento da plataforma apresentaram, quer quando inquiridos pela ACT, quer nos depoimentos que prestaram na audiência final dos presentes autos, uma versão do acidente segundo a qual este teria sido devido a uma (infeliz) casualidade que os mesmos não conseguiram evitar.
5.ª- Os Autores, todavia, vieram, na petição inicial apresentar uma outra versão dos factos, segundo a qual o aparelho não caiu, não tinha como cair, e que foram os aludidos dois trabalhadores da EMP05... que o arremessaram, de propósito, desde a plataforma até ao solo, versão essa que veio a ser acolhida pelo Tribunal a quo, que concluiu que a morte do infeliz EE resultou de ter sido atingido por um dos aparelhos provisórios que os trabalhadores da EMP05..., Pré- Fabricação, S. A. atiraram directamente para o solo.
6.ª- Sucedeu porém que os Autores não demandaram na presente acção os ditos trabalhadores (ao abrigo do disposto no artigo 17.º da LAT), mas sim diversas entidades intervenientes na obra (dona de obra, empreiteiro e subempreiteira), pretendendo que fosse aplicado o artigo 18.º, n.º 1, da LAT.
7.ª- Fizeram-no, no entanto, sem terem alegado factos que se integrassem na previsão dessa norma, limitando-se a afirmar que o acidente “ficou a dever-se à violação de regras de segurança no trabalho”, sem terem concreta e especificadamente alegado qualquer facto do qual pudesse decorrer que o Apelante tivesse violado alguma regra de segurança e o nexo de causalidade entre essa conduta (omissiva) e o acidente.
8.ª- A conclusão do artigo 26.º da petição inicial, de que “a apurar-se a factualidade supra alegada e vindo, por consequência, a concluir-se que o acidente ficou a dever-se à violação de regras de segurança no trabalho, todas as Rés são também responsáveis pelo ressarcimento dos danos ainda não indemnizados e direta e necessariamente consequentes da sua ocorrência, por força do disposto no art. 18.º da Lei n.º 98/2009, de 04/09” desconsidera que essa violação das regras de segurança, a existir, tem que provir das próprias entidades, e não, por exemplo, do sinistrado, de outros trabalhadores ou de terceiro.
9.ª- A ausência de alegação de factos na petição inicial dos quais resultasse ter o Apelante causado directamente o acidente ou violado regras de segurança, e o nexo de causalidade entre esse pretenso facto ilícito e o acidente, traduz manifesta falta de causa de pedir quanto ao pedido formulado a final contra esse Réu, e deveria ter levado à sua absolvição.
10.ª- Como é pacífico, e a própria sentença recorrida o reconhece, era sobre os Autores apelantes que recaía “o ónus de alegarem e provarem não só a inobservância das regras sobre a segurança, higiene e saúde no trabalho por parte da entidade empregadora, como ainda que foi essa inobservância a causa adequada do acidente (n.º 2 do art. 342.º do Código Civil)”.
11.ª- Não obstante, o Tribunal a quo, em sede de “Interpretação e aplicação do direito” veio a considerar estarem não provados e provados determinados factos, relativos a pretensas violações das regras de segurança e nexo de causalidade, que ninguém alegou, como se, quanto aos primeiros, coubesse ao Apelante o respectivo ónus e, quanto aos outros, como se os Autores os tivessem alegado e provado.
12.ª- E imputou ao Apelante a pretensa violação dos artigos 5.º, n.º 3, 20.º e 22.º, n.º 1, alínea b), do Decreto-Lei 273/2003, condenando-o a indemnizar os Autores solidariamente com a 3.ª Ré.
13.ª- Em suma, e ressalvado o devido respeito, o que decorre da sentença é que o Tribunal a quo, face à circunstância de os trabalhadores da EMP05... não terem sido demandados na acção (como deveriam ter sido), decidiu “criar”, ele próprio, factos (não alegados) no sentido de encontrar um bode expiatório (neste caso, dois) a quem pudesse imputar a responsabilidade pelo acidente, por forma a poder aplicar a dita norma do artigo 18.º e atribuir aos Autores a indemnização “agravada”.
14.ª- Os factos aditados pelo Tribunal em sede de sentença — a saber, (i) não provado que o risco previsto e prevenido no artigo 160.º do Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil (“O material dos andaimes, as peças das máquinas e quaisquer outros objectos serão arriados com cuidado e nunca arremessados directamente”) foi especificado e prevenido no plano de segurança ou em outros actos securitários das empresas que executavam trabalhos na obra (empreiteira e subempreiteira); (ii) provado que os trabalhadores que procederam à remoção dos aparelhos provisórios não foram avisados desse risco e não foram advertidos de que estes tinham de ser arriados com cuidado e nunca arremessados directamente; e (iii) provado que a morte do infeliz EE não teria ocorrido, se os trabalhadores tivessem sido advertidos de que não podiam arremessar os aparelhos provisórios directamente ao solo e fossem vigiados para que tal não ocorresse — foram essenciais para a decisão de condenação do Apelante.
15.ª- Todavia, não foram incluídos na decisão sobre a matéria de facto, nem sobre eles foi realizada qualquer prova, o que impede o Apelante de impugnar tal decisão por não poder cumprir os dois primeiros ónus previsto no artigo 640.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.
16.ª- Acresce que essa não inclusão na dita decisão de facto permitiu ao Meritíssimo Juiz a quo abster-se de fundamentar a sua decisão, nomeadamente através da “análise crítica das provas” e da especificação dos concretos meios probatórios determinantes da sua convicção.
17.ª- Resultaram, todavia, dos depoimentos das testemunhas, inquiridas nos autos, factos relevantes por contrariarem aqueles (não alegados) em que o Tribunal a quo fundamentou a decisão de condenação do Apelante, para além de outros que devem ser considerados por terem interesse para a compreensão do que está em causa nos autos para efeitos da decisão de direito.
18.ª- Assim, de acordo com os meios de prova referidos nas alegações devem ser aditados os seguintes factos:
a) À data do acidente desenvolviam-se trabalhos relacionados com a remoção dos apoios provisórios, concretamente a sua movimentação manual para a plataforma de trabalho e a sua colocação no local mais extremo da mesma, a fim de serem baixados ao solo com recurso a meios mecânicos (grua móvel) (...)” (art. 33.º da Contestação do Apelante);
b) A tarefa levada a cabo pelos trabalhadores da EMP05... consistia em duas fases: numa primeira fase, na movimentação manual dos apoios provisórios para a plataforma de trabalho, posicionando-os no local mais externo desta; numa segunda fase, na sua remoção para o solo com o recurso a meios mecânicos (grua). (art. 26.º da Contestação da Ré EMP05...)
c) A grua que seria utilizada no dia do acidente não pertencia à EMP05... mas sim ao EMP04.... (art. 27.º da Contestação da Ré EMP05...)
d) Os trabalhadores da EMP05... sabiam que a tarefa que desempenhavam tinha duas fases, que a primeira fase (manual) terminava com a colocação dos aparelhos nos extremos da plataforma, não contemplando essa fase a remoção de aparelhos para o solo ou a existência de cargas suspensas, e que, só depois de terminada essa fase, naquele dia, se seguiria a segunda fase, de movimentação mecânica.
e) A tarefa realizada pelos trabalhadores da EMP05... aquando do acidente estava sujeita às regras de segurança da movimentação manual de cargas (previstas no documento n.º ... junto com a Contestação do Apelante), não sendo enquadradas nos trabalhos de risco especial.
f) A partir de certa altura, a EMP05... teve necessidade de recorrer a uma grua alheia, o que causava algum embaraço ou atraso na realização da tarefa;
g) Alguns dias antes da data do acidente os trabalhadores da EMP05... arremessaram aparelhos pequenos directamente da plataforma para o solo, numa operação que foi  “vigiada” pelo encarregado II;
h) Os trabalhadores da EMP05... foram directamente questionados sobre o episódio pela Coordenadora de Segurança em Obra;
i) O referido no facto provado 18.º levou a que o EMP04... emitisse uma comunicação por escrito proibindo o arremesso directo, fosse em que circunstância fosse;
j) Os trabalhadores da EMP05... foram advertidos de que os aparelhos nunca poderiam ser arremessados directamente;
k) Os trabalhadores da EMP05... tinham muitos anos de experiência e estavam habituados a executar as operações de movimentação manual dos apoios provisórios seguindo sempre o mesmo procedimento.
l) O sinistrado era o encarregado fixo para o viaduto em questão, sendo sua responsabilidade controlar, entre outras, as actividades desenvolvidas pela Ré EMP05... (artigo 38.º da Contestação da Ré EMP05...)
m) Enquanto trabalhador com a função de Encarregado, o sinistrado “estava habilitado a informar os elementos da Segurança e Saúde no Trabalho sobre qualquer problema ou incumprimento das normas de segurança e saúde por parte dos trabalhadores da EMP05...” (art. 48.º da Contestação do Apelante);
n) Era ao sinistrado que competia impedir que a EMP05... eventualmente executasse trabalhos sem as devidas condições de segurança (art. 49.º da Contestação do Apelante).
19.ª. Sem embargo da impugnação da decisão de facto realizada no presente recurso, o certo é que o aditamento dos mencionados factos pelo Tribunal a quo foi efectuado com violação da regra do ónus de alegação e prova e do princípio do contraditório, o que deve levar a que os mesmos sejam “eliminados”/desconsiderados.
20.º- E não constando da matéria assente nenhum facto de que decorra a violação por parte do Apelante de regras de segurança e o nexo de causalidade necessários à imputação ao mesmo da responsabilidade pelo acidente, deve a acção improceder por falta de causa de pedir.
Sem prescindir:
21.ª-    O Tribunal a quo imputou ao Apelante a infracção das disposições dos artigos 5.º, n.º 3, 20.º (das suas 12 alíneas?) e 22.º, n.º 1, alínea a), do Decreto-Lei n.º 273/2003, de 29 de Outubro, mas não justificou de que modo e em que medida terá o Apelante violado qualquer uma dessas normas, sendo que dos factos provados não resulta nenhuma infracção das mesmas.
22.ª- Bem pelo contrário, o que resulta da matéria que foi dada como assente e da Motivação é que o Apelante, na qualidade de entidade executante, actuou sempre consciente da importância das obrigações de segurança, procurando pautar a sua actuação no estrito cumprimento dos procedimentos e normas que estabeleceu atinentes à segurança dos trabalhadores e assegurar esse cumprimento por parte de todos os intervenientes na obra (cfr. factos provados 39, 47, 48, 49, 50, 51, 52, 53, 54, 55 e 56 e Motivação).
23.- Na realidade, ou bem vistas as coisas, o que resulta da sentença é que a única imputação concreta e directa feita ao Apelante pelo Tribunal a quo terá sido (já que os factos foram dados como não provados) que o risco previsto e prevenido no citado artigo 160.º do Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil (“O material dos andaimes, as peças das máquinas e quaisquer outros objectos serão arriados com cuidado e nunca arremessados directamente”), não foi (não terá sido) especificado e prevenido no plano de segurança ou em outros actos securitários das empresas que executavam trabalhos na obra (empreiteira e subempreiteira) e que desse risco não foram (não terão sido) avisados os trabalhadores que procederam à remoção dos aparelhos provisórios, nem foram (não terão sido) advertidos de que estes tinham de ser arriados com cuidado e nunca arremessados directamente.
24.ª- Sem embargo de estes factos não terem sido alegados, nem terem resultado da instrução, o certo é que, salvo o devido respeito, o Tribunal a quo fez uma errada interpretação das normas legais ao considerar que o plano de segurança devia conter a previsão acima mencionada e que os trabalhadores deviam ter sido avisados dela.
25.ª- Com efeito essa proibição consta de um Regulamento que no seu artigo 152.º prevê a sua distribuição “aos operários da construção civil por intermédio dos organismos corporativos que os representam”, sendo que, nos termos do disposto na alínea j) do artigo 128.º do Código do Trabalho, constitui dever do trabalhador “Cumprir as prescrições sobre segurança e saúde no trabalho que decorram de lei ou instrumento de regulamentação colectiva de trabalho”.
26.ª- O Plano de Segurança e Saúde no Trabalho não pode não tem que prever todos os comportamentos (ilícitos) que os trabalhadores decidam adoptar em contradição com as tarefas e as instruções que lhes sejam dadas e com o que decorre da lei.
27.ª- Por outro lado, e salvo o devido respeito, o facto aditado pelo Tribunal de que “a morte do infeliz EE não teria ocorrido, se os trabalhadores tivessem sido advertidos de que não podiam arremessar os aparelhos provisórios directamente ao solo”, com o que necessariamente considerou “provado”, sem base para tal, que os trabalhadores não foram advertidos dessa proibição, não tem qualquer relevo se não constar da matéria assente que os trabalhadores da EMP05... não sabiam que não podiam arremessar os aparelhos para o solo.
28.ª- Resulta dos depoimentos prestados em audiência que os trabalhadores da EMP05..., não só sabiam que não podiam arremessar os aparelhos para o solo como que disso foram advertidos, se não antes, pelo menos após o episódio relativo ao arremesso efectuado alguns dias antes do acidente.
29.ª- A própria a forma como os trabalhadores contaram a dinâmica do acidente, primeiro perante a ACT e depois em Tribunal, no sentido de afastar a sua responsabilidade pelo sucedido, evidenciou que sabiam que não podiam ter arremessado o aparelho.
30.ª- Com efeito, de outro modo, bastaria aos trabalhadores terem simplesmente dito que nunca ninguém lhes dissera que não o podiam fazer e que não sabiam que não podiam (se tal fosse aceitável), em vez de inventarem toda uma história, de tal forma absurda, fisicamente impossível e em si mesma contraditória, para explicarem o acidente.
31.ª- A sentença recorrida acrescentou, no entanto, ainda um outro facto: o de que os trabalhadores não teriam arremessado os aparelhos provisórios directamente ao solo se tivessem sido vigiados!
32.ª- Este súbito, e também imprevisto, acrescento revela várias coisas:
33.ª- Em primeiro lugar, revela que o Tribunal considerou que a especificação da proibição constante do artigo 160.º do Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil “no plano de segurança ou em outros actos securitários das empresas que executavam trabalhos na obra (empreiteira e subempreiteira)” e a advertência dos trabalhadores de que os aparelhos provisórios “tinham de ser arriados com cuidado e nunca arremessados directamente” era, afinal, irrelevante, uma vez que os trabalhadores, se as circunstâncias o permitissem e, por exemplo, quisessem ir de fim de semana mais cedo, sempre o poderiam fazer. Não bastava, portanto, inserir a proibição no PSS ou em outros “actos securitários”, nem era suficiente ter advertido os trabalhadores dessa proibição.
34.ª- Pelo que necessariamente se tem de concluir que o Tribunal, bem vistas as coisas, considerou não existir uma relação de causalidade adequada entre o acidente e a putativa omissão quer da proibição no PSS quer da advertência dos trabalhadores para não arremessarem os aparelhos directamente para o solo.
35.ª-    O que, no fundo significa que todos os factos inseridos pelo Tribunal com vista à responsabilização do Apelante resumem-se afinal a um: os trabalhadores tinham que ser vigiados.
36.ª- Em segundo lugar, revela um profundo desrespeito, por parte do Tribunal, relativamente a estes e quaisquer outros trabalhadores, por os considerar pessoas de pouco tino, sem capacidade de entendimento, sentido crítico e bom senso.
37.ª- De acordo com o entendimento da sentença, os trabalhadores da EMP05... não saberiam que arremessar um aparelho de 150 quilos para o solo desde uma plataforma a 35 metros de altura, para além de proibido, era altamente perigoso, arriscado, imprudente e arrojado (ainda mais não tendo lá o encarregado, cá em baixo a “vigiar”.... para ver se alguém se aproximava).
38.ª- Em terceiro lugar, revela que o Tribunal considera que numa obra, como a que está em causa, com a extensão e o número de trabalhadores na mesma presentes, era fisicamente possível para os técnicos de segurança ou encarregados da obra estarem constantemente presentes em todos os locais em simultâneo, vigiando e controlando os comportamentos de todos e de cada um dos trabalhadores a toda a hora e em cada segundo, para impedir a ocorrência de sinistros.
39.ª- O que é manifestamente um absurdo e não é exigido pela lei.
40.ª- Com efeito, a partir de determinado ponto de formação, instrução e alerta para os pontos mais relevantes adstritos a cada actividade, a responsabilidade pelo cumprimento constante e integral das respectivas regras de prevenção cabe, igualmente, aos próprios trabalhadores.
41.ª-    Acresce que, como acima se viu, ficou provado que, quem tinha legitimidade para impedir que a EMP05... eventualmente executasse trabalhos sem as devidas condições de segurança era, precisamente, em primeira linha, o sinistrado, no exercício das suas funções de encarregado, que acaso verificasse alguma violação do PSS, imediatamente actuaria, mas que não pôde actuar porque foi ele próprio vítima do acidente.
42.ª-    Finalmente, se se considerasse como parece entender o Tribunal a quo que é de imputar ao empregador a responsabilidade por todo e qualquer acidente — mesmo que, por exemplo, o sinistrado tivesse violado as regras e a lei ou actuado com negligência grosseira —, com o argumento de que o acidente teria sido evitado se o trabalhador fosse vigiado, nunca haveria a descaracterização do acidente que é uma hipótese prevista na lei.
43.ª-    O disposto no artigo 14.º, n.º 1, que na sua alínea a) dispõe que “O empregador não tem de reparar os danos decorrentes do acidente que for dolosamente provocado pelo sinistrado ou provier de seu acto ou omissão, que importe violação, sem causa justificativa, das condições de segurança estabelecidas pelo empregador ou previstas na lei”; e na alínea b) imputa também ao sinistrado (que é um trabalhador) a responsabilidade pelo acidente em caso de negligência grosseira, deve ser tido em conta na avaliação da conduta de outros trabalhadores para efeitos de se verificar se o acidente foi causado directamente por eles, com vista à aplicação do artigo 17.º da mesma LAT.
44.ª-    Ora, dúvidas não restam de que o acidente em causa nos presentes autos proveio exclusivamente da actuação voluntária dos trabalhadores da EMP05..., que não só violaram, sem causa justificativa, o disposto no artigo 160.º do Regulamento de Segurança no Trabalho de Construção Civil, como agiram com “negligência grosseira”.
45.ª- O que leva a que tenha forçosamente que entender-se pela não aplicabilidade do artigo 18.º da LAT ao caso sub judice, uma vez que a responsabilidade do acidente é exclusivamente imputável aos trabalhadores da EMP05..., nos termos do artigo 483.º do Código Civil.
46.ª- A sentença recorrida, ao condenar o Apelante a indemnizar os Autores, constitui, por tudo o acima exposto, uma verdadeira decisão surpresa, que, para além de não ter base factual quanto às infracções que àquele foram imputadas, é, salvo o devido respeito, manifestamente injusta.
47.ª- Se se entender que a norma aplicável é a do artigo 18.º da LAT, então verifica-se a falta de interesse em agir dos Autores, que é uma excepção inominada de conhecimento oficioso.
48.ª- Com efeito, como resulta do “auto de conciliação” junto aos autos, no processo emergente de acidente de trabalho n.º 376/12...., relativo ao sinistro aqui em causa, os Autores (representados pela Autora) não invocaram que tivesse havido violação de normas de segurança da parte do empregador ou de qualquer uma das entidades referidas no artigo 18.º da LAT.
49.ª- O que de acordo com o que vem sendo entendido, fez precludir o seu eventual direito decorrente dessa violação e os impede de interpor uma acção pedindo o ressarcimento de outros danos.
50.ª- A presente acção foi proposta muito mais de três anos após a ocorrência do acidente, pelo que se verifica a excepção de prescrição do direito de indemnização nos termos do disposto no artigo 498.º, n.º 1, do Código Civil.
51.ª- A douta sentença recorrida sustenta que é aplicável o prazo de 10 anos em virtude de o facto ilícito constituir um crime, mas o certo é que o “evento” criminoso e que descreve e que pode preencher o tipo legal do crime de homicídio involuntário não foi praticado pelo Apelante mas sim pelos trabalhadores que não foram demandados.
52.ª- Sempre se acrescentará que o alegado facto (de resto, falso) de o Apelante não ter alertado expressamente os trabalhadores da obra sobre a proibição de arremessar directamente para o solo um aparelho com 150 quilos, de forma alguma pode consubstanciar uma não avaliação do perigo ou a falta de medidas de prevenção adequadas. Tal como quem pode o mais, pode o menos, também quem deve o mais deve o menos, pelo que, se os trabalhadores devem respeitar as instruções recebidas nas formações sobre o manuseamento dos materiais, se são instruídos de todo o procedimento adequado que devem pôr em prática nas suas funções, se são avisados expressamente do perigo associado às funções e dos cuidados necessários que devem ter na remoção dos aparelhos provisórios, então lógica e certamente devem arriar os materiais com cuidado e nunca os arremessar diretamente!!
53.ª- Qualquer pessoa minimamente diligente e capaz — como é o caso dos trabalhadores qualificados para as funções assumidas — tem consciência de que um aparelho de betão, com, pelo menos, 150 kg de peso, tem de ser utilizado e movimentado com o máximo cuidado, não podendo, de forma alguma, ser arremessado diretamente, ainda por cima quando os trabalhos se realizam a uma altura de cerca de 35 metros, pois tal coloca em risco não só a vida de terceiros mas a dos próprios trabalhadores que o arremessam.
54.ª- Em nenhum setor de atividade, bem como em nenhuma situação da vida quotidiana, é possível acautelar, de forma taxativa e exaustiva, todas e quaisquer possíveis acções inerentes a uma certa tarefa. Ainda menos aquelas que são realizadas em violação da lei e com negligência grosseira.
55.ª-Veja-se, por exemplo, a situação (e são tantas as que se podem imaginar) em que um trabalhador empurra um seu colega para debaixo de uma retroescavadora: alguém se lembraria de acusar o empreiteiro de violação de regras de segurança por não ter incluído no plano específico da tarefa em causa que não se podia empurrar os colegas para debaixo de retroescavadora, ou de não ter advertido o trabalhador de que não o devia fazer, ou de não ter vigiado esse mesmo trabalhador para evitar que este cometesse tal acto?
56.ª- Acresce que, sendo a norma do artigo 152.º-B do Código Penal uma norma penal em branco e não se tendo verificado qualquer violação das normas assinaladas na sentença, não se podem considerar como preenchidos os pressupostos do tipo legal de crime de violação de regras de segurança, o qual tem como premissa a violação da obrigação de garantir as condições de segurança no trabalho.
57.ª- De forma alguma é referido na sentença (porque não resulta de nenhum dos seus elementos) que o sinistrado ou os trabalhadores da EMP05... tivessem sido sujeitos a uma situação de perigo para a sua vida, corpo ou saúde por estarem a realizar a sua tarefa fora das indispensáveis condições de segurança que não terão sido implementadas pelo Apelante e pela 3.ª Ré, sabendo estes que desse modo os estariam a expor ao perigo e conformado com isso.
58.ª- Resulta, como tal, que o Apelante não cometeu qualquer ilícito, e ainda menos de natureza criminal, não podendo por isso ser aplicado o disposto no artigo 498.º, n.º 3, quanto ao prazo de prescrição.
59.ª- A douta sentença recorrida violou, por errada interpretação e aplicação, as normas dos artigos 342.º, 483.º e 498.º do Código Civil, 3.º, 5.º, 154.º n.º 1 e 607.º, do Código de Processo Civil, 14.º, 17.º e 18.º da Lei n.º 98/2009, 5.º, n.º 3, 20.º e 22.º, n.º 1, alínea a), do Decreto-Lei n.º 273/2003, 152.º e 160.º do Decreto n.º 41 281, 128.º do Código do Trabalho e 99.º a 114.º do Código de Processo do Trabalho.”
*
A EMP03..., S.A. também não se conformou e interpôs o presente recurso de apelação, tendo terminado as suas alegações com as seguintes conclusões:

“1. O presente recurso tem por objeto a sentença proferida, em 04 de julho de 2022, pelo Juízo Central Cível e Criminal de Bragança, na parte que julgou improcedente a exceção de prescrição invocada e julgou parcialmente procedente a ação, condenando a Recorrente nos termos do artigo 486.º do Código Civil, por não ter especificado expressamente no plano de segurança o risco previsto e prevenido no artigo 160.º do Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil e assim ter infringido as disposições dos artigos 5.º, n.º 2, 7.º, alínea a) e 17.º, alínea b) do Decreto-Lei n.º 273/2003 e o já citado artigo 160.º do Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil.
2. Em consequência, o Tribunal a quo considerou estarem verificados os factos constitutivos para a atribuição aos Recorridos, da indemnização por perda de alimentos, nos termos do artigo 495.º, n.º 3 do CC.
3. Resulta da sentença a quo que o evento que causou a morte do sinistrado EE reúne todos os pressupostos do tipo legal de crime, previsto no artigo 152.º-B, n.ºs 1, 2 e 4, alínea b), do CP, motivo pelo qual o prazo de prescrição é de 10 anos, por efeito do disposto nos artigos 118.º, n.º 1, alínea b), do CP e 498.º, n.º 3, do CC.
4. Entende a Recorrente que não é aceitável a manutenção, na ordem jurídica, da sentença a quo, dado que, a mesma é nula:
a. por não discriminação da matéria de facto dada como não provada;
b. por excesso de pronúncia na parte em que condena as Rés, entre as quais a Recorrente, ao pagamento de 20.000,00€ a título da indemnização prevista no artigo 495.º, n.º 3 do CPC ao 3.º Autor, CC, dado que nada foi peticionado nos autos por este a título de alimentos;
c. por excesso de pronúncia, na parte em que condena a Recorrente com base numa causa de pedir não invocada pelos Autores;
d. por excesso de pronúncia, na parte em que condena a Recorrente ao pagamento da indemnização prevista no artigo 405.º, n.º 3 do CC sem terem sido alegados ou provados pelos Recorridos, os factos constitutivos do seu direito.
5. Padecendo ainda de notório erro de julgamento, por errada valoração da matéria de facto e por errada aplicação do direito, na medida em que:
a. foram trazidos aos autos factos relevantes que não foram corretamente valorados pelo Tribunal a quo, impondo-se a alteração da matéria de facto considerada provada e não provada;
b. deve ter-se por verificada a exceção de prescrição do direito dos Recorridos;
c. não existe norma legal que obrigue a Ré-Recorrente a identificar especificada e expressamente no Plano de Segurança e Saúde que era proibido o arremesso direto dos apoios provisórios;
d. não se encontram preenchidos os pressupostos necessários para a atribuição aos Autores da indemnização prevista no artigo 495.º, n.º 3 do CC, e os critérios utilizados para a fixação dos montantes condenatórios estão incorretamente considerados.
6. Quanto à nulidade da sentença, por falta de discriminação da matéria de facto dada como não provada, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea b), do CPC, diga-se que as decisões judiciais, nomeadamente, as sentenças têm que ser fundamentadas, nos termos do artigos 154.º e 607.º, n.º 4, ambos do CPC e 205.º, n.º 1, da CRP, de modo a assegurar quer as Partes quer as Tribunal de Recurso o controlo e a sindicância da matéria julgada, pelo que é exigido ao juiz a discriminação dos factos tidos por si como provados e como não provados, por reporte aos factos oportunamente alegados pelas partes e sobre os quais tenha incidido produção de prova, não bastando uma remissão genérica, na parte dos factos dados como não provados, para a “a restante matéria alegada nos articulados”, como faz a sentença a quo, estando o Meritíssimo Juiz a quo obrigado a indicar quais os concretos factos que constam das contestações das Recorrentes que considerou como não provados e bem assim as razões que motivaram tal juízo.
7. Ao omitir as formalidades previstas no art.º 607.º, n.º 4, do CPC, o Tribunal a quo feriu a Sentença de nulidade, o que justifica a sua revogação, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea b), do CPC, o que desde já se invoca.
8. A sentença a quo é igualmente nula, por excesso de pronúncia, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC, em dois segmentos distintos:
a. Em primeiro lugar, é nula porque condenou a Recorrente no pagamento de indemnização de 20.000,00€, nos temos do artigo 495.º, n.º 3 do CC, ao 3.º Recorrido, CC, quando este não formulou qualquer pedido de condenação das Rés a este título, na Petição Inicial, nomeadamente, no artigo 37.º da P.I, no qual consta o pedido formulado pelos restantes autores;
b. Em segundo lugar, é nula porque condenou a Recorrente sustentando-se em causa de pedir que não foi alegada na Petição Inicial, dado que analisada a Petição Inicial,em momento algum os Recorrentes afirmaram que a Recorrente tinha o dever de especificar e prevenir no Plano de Segurança e Saúde que os apoios provisórios tinham de ser arriados com cuidado e que era expressamente proibido arremessa-los diretamente, o mesmo sucedendo relativamente à necessária alegação do nexo de causalidade entre essa omissão e o dano verificado (a morte do Sr. EE).
9. A Recorrente deduz ainda impugnação da matéria de facto, nos termos do artigo 640.º do CPC na medida em que considera ter existido, por parte do Tribunal a quo, uma errada valoração da prova, a qual impunha que fossem retiradas ilações diferentes daquelas vertidas na sentença de que se recorre.
10. De igual modo, entende a Recorrente que da prova produzida resultam factos relevantes para a boa decisão da causa que deveriam ter sido atendidos e não o foram e, bem assim, outros há que constam da matéria de facto provada, mas que, em face da prova produzida, deveriam ter sido julgados como não provados.
11. Concretamente, entende a Recorrente
a. que a matéria de facto provada relativa à existência e execução do Plano de Segurança e Saúde na obra em causa, constante dos factos 36.º a 43.º, 47.º a 56.º da sentença recorrida, está incorretamente julgada, devendo ser aditada à mesma a matéria alegada pela Recorrente, sob o artigo51.ºda sua Contestação, a saber: “À data do acidente desenvolviam-se trabalhos relacionados com a remoção dos apoios provisórios, concretamente a sua movimentação manual para a plataforma de trabalho e a sua colocação no extremo da mesma a fim de serem removidos para o solo com recurso a meios mecânicos (grua móvel).”, em resultado do depoimento prestado, em 27 de novembro 2020, pela testemunha, JJ, entre os minutos 00:20:22 e 00:21:58 do qual resulta indubitavelmente que existia uma grua disponível no local para ser utilizada na movimentação da carga em causa;
b. ter sido incorretamente julgada a matéria por si alegada, sob os artigos 56.º e 64.º da Contestação, a qual resultou confirmada pela prova testemunhal produzida, nomeadamente, pelos depoimentos de GG, em 04 de abril de 2019, minutos [00:33:13] a [00:44:08], de II, no mesmo dia 04 de abril de 2019, minutos [00:16:13] a [00:16:20], de JJ, a 27 de novembro de 2020, minutos 00:118:18 a 00:3817, KK, a 05 de abril de 2019 [entre os minutos 00:36:36 e 00:38:07, 00:46:21 a 00:47:00, e 01:01:45 a 02:08:32], HH, em 04 de abril de 2019, [minutos 00:55:57 a 00:56:39], dos quais resultou que no momento do acidente não circulavam pessoas ou veículos, com exceção do veículo conduzido pelo sinistrado, pelo que deve ser aditado à matéria de facto dada como provada que “Nenhum outro veículo ou pessoa circulava sob o pilar ... do viaduto naquele dia e hora para além do sinistrado, o qual tinha conhecimento dessa proibição de circulação”;
c. E bem assim dos mesmos depoimento supra invocados, resulta ainda o conhecimento que o sinistrado detinha sobre os trabalho que concretamente decorriam no local, em complemento ao seu conhecimento relativo ao conteúdo do PSS e das Fichas de Prevenção de Risco aplicáveis, devendo por isso, aditar-se ainda à matéria de facto provada que “O Sinistrado era um Encarregado de Obra, conhecedor bastante não só de todo o PSS e das Fichas de Prevenção de Risco aplicáveis bem como do programa de retirada dos apoios provisórios do pilar 6 em curso como foi ele que deu essa ordem”.
d. ter sido incorretamente julgada a matéria vertida como provada no do ponto 18.º da sentença, reproduzindo o artigo 20.º da petição inicial, dado que não pode ser retirado dos diversos depoimentos prestados, concretamente, pelas Testemunhas JJ, em 27 de novembro 2020, [minutos 00:43:03 a 00:44:10], KK, em 05 de abril de 2019, [minutos 01:35:17 a 02:06:42], II, em 04 de abril de 2019, [minutos 00:18:53 a 00:19:13], de onde não se extrai a conclusão de que o modus operandi fosse o de arremessar os apoios diretamente para o solo, como concluiu o Tribunal a quo.
e. Pelo contrário, dos referidos depoimentos resulta que o procedimento instituído era o da utilização da grua para a remoção dos apoios provisórios sendo que, quando identificado o desvio, de imediato foi emitida comunicação para o cumprimento rigoroso do procedimento.
f. Pelo que deve o citado ponto 18.º tal como considerado pelo Tribunal a quo ser alterado.
g. Com efeito, em face da prova produzida, em concreto, dos depoimentos das Testemunhas HH (04 de abril de 2019), minutos 00:35:17 a 00:47:44 e 00:03:24 a 00:03:41, GG (04 de abril de 2019), minutos 00:12:41 a 00:59:48, II (04 de abril de 2019), minutos 00:18:53 a 00:20:38, JJ (27 de novembro de 2020), minutos 00:43:03 a 00:44:10, o facto n.º 18 da matéria de facto dada como provada ser desconsiderado como tal, devendo o mesmo passar a ter a seguinte redação: “O procedimento habitual da retirada dos apoios provisórios consistia, numa primeira fase da deslocação manual para as pontas da plataforma e, posteriormente, com a utilização de uma grua eram colocados no chão”.
h. deve ainda aditar-se à matéria de facto dada como provada o seguinte facto: “No dia anterior ao acidente foram atirados diretamente para o solo dois apoios provisórios de um pilar cuja altura rondava os 3/4 metros tendo sido comunicado de imediato aos trabalhadores que estavam expressamente proibidos de remover os apoios arremessados diretamente para o chão independentemente da altura do pilar”, dado que tal resulta do depoimento da Testemunha KK (05 de abril de 2019), minutos 01:35:17 a 02:06:42.
i. ter sido incorretamente julgada a matéria por alegada pela Recorrente sob o artigo 61.º da contestação, dado que a prova da mesma resulta do depoimento da Testemunha KK (05 de abril de 2019), minutos 00:29:19 a 00:30:55, 01:08:54 a 01:10:59, 02:07:49 a 02:08:20, LL, (05 de abril de 2019), minutos 00:06:26 a 00:07:07, MM (04 de abril de 2019), minutos0 0:04:21 a 00:05:15, pelo que deverá ser aditada à matéria de facto dada como provada nos termos seguintes: “Os dois trabalhadores em causa no incidente e o encarregado de obra sinistrado conheciam o PSS e as fichas de prevenção de riscos relevantes para as tarefas que se desempenhavam naquele local e hora, concretamente, os procedimentos de Movimentação Manual de Cargas (FPR023A02) e na Movimentação Mecânica de Cargas (FPR028A02)”;
j. que afigura-se ainda relevante para a descoberta da verdade material, o aditamento à matéria de facto dada como provada, que “Após o acidente, o procedimento de retirada dos apoios provisórios manteve-se inalterado não obstante a intervenção da Autoridade Para as Condições do Trabalho”, dado que tal resulta da prova testemunhal produzida, nomeadamente, do depoimento de KK (05 de abril de 2019), minutos 01:51:25 a 01:51:50, 02:04:41 a 02:05:27, do depoimento de MM (04 de abril de 2019), minutos 00:27:48 a 00:29:00.
k. que deve ainda aditar-se à matéria de facto dada como provada que “A ACT autorizou a retomada dos trabalhos, exigindo apenas que fosse cumprida a proibição de circulação de pessoas debaixo das cargas suspensas”, dado que isto resulta, por um lado, da prova documental junta aos autos– Documento n.º ... da Contestação da Recorrente – e ainda das declarações das testemunhas LL (05 de abril de 2019) minutos 00:13:20 a 00:14:00 e KK (05 de abril de 2019), minutos 01:51:25 a 01:51:50;
l. ter sido incorretamente julgada a matéria que consta do ponto 7.º da matéria de facto dada como provada, uma vez que não ficou provado qual a real dimensão e peso do apoio provisório que vitimou o Sr. EE, tendo os diversos depoimentos (a saber: HH, (04 de abril de 2019), minutos 00:04:52 a 00:05:18, GG (04 de abril de 2019), minutos 00:23:55 a 00:24:22, MM (04 de abril de 2019), minutos 00:10:04 a 00:26:31 e LL (05 de abril de 2019) minutos 00:18:25 a 00:18:42) situado o peso do apoio provisório entre os 80kg e os 150kg, pelo que, deve em consonância o facto 7.º, ser alterado passando a ter a seguinte redação: “No momento em que o Sr. EE aí passava, foi inopinadamente surpreendido pela queda de um aparelho de apoio provisório de betão - de seguida apenas apoio provisório, com, pelo menos, 80 kg de peso, a cair de uma altura de cerca 35 metros, em cima do tejadilho da viatura”.
m. ter sido incorretamente julgada o ponto 10.º da matéria de facto dada como provada, dado que resultou de modo espontâneo do depoimento da testemunha LL (05 de abril de 2019) minutos 00:21:54 a 00:22:02, as dimensões de 30x30x60 e todas as demais foram resultaram afirmadas por via das sugestões avançadas pelo próprio Tribunal a quo (depoimento da testemunha LL (05 de abril de 2019) minutos 00:50:12 a 00:50:49, pelo que deve, em consonância o facto n.º 10.º, ser alterado passando a ter a seguinte redação: “Com cerca de 30 centímetros de comprimento por 60 cm de altura e com a base, que efetivamente apoia, com cerca de 30 cm”.
n. ter sido incorretamente julgado o ponto 20.º da matéria de facto provada, do qual consta que “A 1ªA./viúva, como doméstica que era, e continua a ser, e seus filhos(2ºe 3ºAA.),viviam, à data do infeliz evento, em exclusivo, do rendimento do trabalho do Sr. EE.”
o. Do “requerimento de apoio judiciário, onde se declaram os rendimentos do ano de 2015” invocado, junto com a petição inicial, apenas estão identificados pelos interessados, aqui Recorridos, os rendimentos destes relativos ao ano de 2015, não constando qualquer referência aos rendimentos auferidos em 2012 e, menos ainda, que à data da morte do Sr. EE, vivessem na dependência exclusiva dos seus rendimentos.
p. Aliás, do mesmo documento extrai-se que em 2015, o agregado familiar dispunha de rendimentos no valor global de12.852,70€, bem como de uma casa de morada de família e ainda de um veículo automóvel, correspondendo a estes últimos, a forma de aquisição como sendo “compra”.
q. Pelo que este documento não é suscetível de constituir prova suficiente de que, em 2012, era o rendimento do falecido EE que provia em exclusivo às necessidades de sustento, vestuário e alimentação, saúde e habitação do agregado familiar.
r. Por seu turno, no depoimento da Testemunha DD prestado em 04 de 04 de 2019, [00:05:10] a [00:00:39], no qual se fundou igualmente o Tribunal a quo para sustentar a sua convicção, que esta não foi sequer questionada, nem esclareceu de livre e espontânea vontade, qual o contributo do falecido EE para os rendimentos do agregado familiares.
s. Assim, deve eliminar-se o ponto 20.º da matéria de facto dada como provada e aditar-se à matéria de facto dada como não provada que “A 1ª A./viúva, como doméstica que era, e continua a ser, e seus filhos (2º e 3º AA.), viviam, à data do infeliz evento, em exclusivo, do rendimento do trabalho do Sr. EE.”
t. Está também incorretamente julgado o ponto 23.º da matéria de facto dada como provada do qual consta que “A morte do Sr. EE privou, assim, os AA. de meios de regular e adequada subsistência, tendo os mesmos passado a sobreviver com carências que, até então, desconheciam”.
u. Como referido não foi produzida prova suficiente que permita afirmar que a morte do falecido EE privou os Recorridos de meios de subsistência, pois conforme consta da habilitação de herdeiros junta como Documento n.º ... com a petição inicial o falecido EE deixou três bens imóveis, dois deles eram prédios urbanos e um prédio misto, os quais têm, por certo, um valor económico.
v. Pelo que deve eliminar-se o ponto 23.º da matéria de facto dada como provada, aditando-o antes à matéria de facto dada como não provada.
12. Entende ainda a Recorrente que a sentença a quo enferma de notório erro de julgamento relativamente à aplicação do direito, em três segmentos decisórios:
a. quanto à decisão relativa à exceção perentória de prescrição;
b. quanto à decisão quanto à responsabilidade civil da recorrente na qualidade de “dono de obra”, nomeadamente, quanto à responsabilidade civil extracontratual por omissão da Recorrente
13. A sentença a quo enferma de erro na aplicação do direito, ao ter considerado que o evento que causou a morte do trabalhador falecido reúne todos os pressupostos do tipo legal de crime previsto no artigo 152.º-B, n.ºs 1, 2 e 4, alínea b), do Código Penal (adiante, “CP”), motivo pelo qual o prazo de prescrição é de 10 anos, por efeito do disposto nos artigos 118.º, n.º 1, alínea b), do CP e 498.º, n.º 3, do CC.
14. Contudo, se os Recorridos pretendiam beneficiar do prazo mais longo de prescrição teriam necessariamente de alegar e provar que, no caso concreto, se mostram preenchidos todos os elementos essenciais do tipo legal de crime que fundamenta o exercício do direito indemnizatório;
15. Os Recorridos não alegaram, nem demonstraram, que os factos que fundamentam o direito à indemnização que reclamam preenchem qualquer tipo legal de crime e menos ainda, o de violação de regras de segurança, previsto e punido pelo artigo 152.º-B, n.ºs 1, 2 e 4, alínea b), do CP, para a partir desse raciocínio se inferir o prazo prescricional de 10 anos e dele beneficiarem.
16. Entende a Recorrente que a aplicação do disposto no artigo 498.º, n.º 1, segunda parte, do CC e a consequente aplicação do prazo de prescrição mais alargado, depende da alegação e prova dos elementos objetivo e subjetivo do crime por parte de quem se arroga do direito indemnizatório, bem como da sua imputação à pessoa coletiva, nos termos do artigo 11.º do CP – o que não sucedeu in casu.
17. A sentença a quo enferma ainda de erro na aplicação do direito, ao ter condenado a Recorrente, nos termos do artigo 486.º do Código Civil, porque “não especificou o identificado perigo no plano de segurança”, tendo, no entender do Tribunal a quo infringido as disposições dos artigos 5.º, n.º 2, 7.º, alínea a) e 17.º, alínea b) do Decreto-Lei n.º 273/2003.
18. Segundo a norma positivada no artigo 486.º do CC, as simples omissões dão lugar à obrigação de reparar os danos, quando, exista o dever jurídico de praticar o ato omitido e que este tivesse seguramente ou com maior probabilidade, obstado ao dano.
19. Ao contrário do que o Tribunal a quo afirma não existe norma legal que obrigue a Recorrente a identificar especificada e expressamente que era proibido o arremesso direto dos apoios provisórios, o dever jurídico ínsito no Decreto-Lei n.º 273/2003,de 29 de outubro, da Portaria n.º 101/96, de 3 de abril e no Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil era o de prever medidas de proteção coletiva adequadas e eficazes no sentido de garantir que os objetos serão arriados com cuidado e nunca arremessados diretamente, isto é, de prevenir quedas em altura – dever que a Recorrente cumpriu no Plano de Segurança e Saúde que mandou elaborar e estava em execução.
20. Não era exigível à Recorrente prever no Plano de Segurança e Saúde todas as ações (ou omissões) que não se podiam tomar para efeito da retirada dos apoios provisórios (ou mesmo da movimentação de cargas), dado que tal imposição constituía a Recorrente numa obrigação verdadeiramente diabólica, na medida em que, na prática é impossível prever todas as ações (e omissões) que não deviam ser tomadas na remoção dos apoios provisórios.
21. Mesmo que assim não se entenda, sempre se diga que decorre da experiência da vida e do senso comum que o arremesso de objetos de cima de um viaduto, com um peso entre 80kg e 150kg de peso de uma altura de cerca de 35 metros pode colocar em risco a segurança de quem neles presta a sua atividade.
22. No mais, conforme resultou provado, a proibição de arremesso dos apoios provisórios, ínsita nos procedimentos instituídos em obra, era bem conhecida dos trabalhadores que se dedicam profissional e quotidianamente à atividade de construção civil – cfr. ponto 54.º da matéria de facto provada.
23. Acresce que a ACT no exercício das suas competências fiscalizadoras se entendesse que a Recorrente tinha um dever legal de prever no Plano de Segurança e Saúde especificadamente de que os trabalhadores estavam proibidos de arremessar os apoios provisórios, seria expectável que não autorizasse o recomeço dos trabalhos sem que o Plano de Segurança e Saúde fosse revisto, o que não sucedeu in casu e o que constitui fundamento relevante para absolver a Recorrente do pedido.
24. Neste sentido, seguiram as decisões proferidas pelo Supremo Tribunal de Justiça, nos processos n.º 102/05.7TVLSB.E1.S1, de 09.07.2015 e 600/04.0TBSTB.E1.S1, de 22.06.2021, e citadas pelo Tribunal a quo para fundamentar a condenação da Recorrente, que entenderam que a Dona de Obra só poderia ser responsabilizada, por faltas por si cometidas ao nível da conceção da obra ou por inobservância dos seus deveres de fiscalização, nomeadamente, em matéria de segurança e fiscalização.
25. No entanto, também resulta das mesmas decisões que tendo sido apurado nos autos que o processo de contraordenação absolveu a Dona de Obra nesta sede – como também sucedeu in casu, então, não se poderá decidir pela sua responsabilidade – cfr. ponto VII e VIII do sumário do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, no processos n.º 102/05.7TVLSB.E1.S1, de 09.07.2015.
26. Também por esta razão padece a sentença a quo de erro de julgamento, ao afirmar a responsabilidade civil extracontratual da Recorrente, por omissão, nos termos do artigo 486.º do CC, com fundamento no incumprimento do disposto no artigo 160.º do Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil, e, bem assim, das disposições dos artigos 5.º, n.º 2, 7.º, alínea a) e 17.º, alínea b) do Decreto-Lei n.º 273/2003, na medida em que estas normas não devem ser interpretadas no sentido de obrigar a Dona de Obra a incluir expressamente no Plano de Segurança e Saúde a proibição de arremessar diretamente o material dos andaimes, as peças das máquinas e quaisquer outros objetos, sendo suficiente a prescrição de procedimentos visando evitar tal risco.
27. Assim, andou mal a sentença a quo ao interpretar o artigo 5.º, n.º2, 7.º, alíena a) e 17.º, alínea b) Decreto-Lei n.º 273/2003, de 29 de outubro, da Portaria n.º 101/96, de 3 de abril e o artigo 160.º do Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil no sentido de existir um dever jurídico de especificar no Plano de Segurança e Saúde que era expressamente proibido o arremesso direto ao solo dos apoios provisórios, extraindo dessa errada interpretação a responsabilidade civil da Recorrente, por omissão, nos termos do artigo 486.º do CC.
28. Em consequência, deve a sentença a quo ser revogada e substituída por Acórdão que julgue que as normas do Decreto-Lein.º273/2003, de 29 de outubro, da Portaria n.º 101/96, de 3 de abril e no Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil não impunham à Recorrente um dever jurídico de especificar no Plano de Segurança e Saúde que era expressamente proibido o arremesso direto ao solo dos apoios provisórios, e desse modo, não considerar a Recorrente responsável a título de omissão, nos termos do artigo 486.º do CC.
29. Por outro lado, não se verifica qualquer nexo de causalidade entre o alegado dever omitido pela dona de obra de não menção no Plano de Segurança e Saúde da proibição de arremesso dos apoios provisórios e o dano ocorrido.
30. Constava do Plano de Segurança e Saúde que não era permitido que os trabalhadores se posicionassem no raio de ação dos meios mecânicos de elevação de cargas ou no trajeto das mesmas, e bem assim, que era interdita a circulação de pessoas no local.
31. Apesar desta proibição expressa que constava do Plano de Segurança e Saúde, a verdade é que o infeliz EE, não cumpriu também ele com esta proibição e lamentavelmente circulou no local em momento em que não o deveria fazer e conhecia os riscos associados.
32. Se a proibição de circulação naquele local tivesse sido, como deveria, respeitada pelo próprio trabalhador sinistrado, o acidente não se teria verificado.
33. Assim, verifica-se que a sentença a quo andou mal ao subsumir os factos dados como provados, à norma positivada do artigo 486.º do CC, pelo que deve a sentença a quo ser revogada e substituída por Acórdão que julgue pela inexistência de nexo de causalidade entre a alegada omissão de prever no Plano de Segurança e Saúde a proibição de arremesso dos apoios provisórios e o dano ocorrido, devendo, ser também nesta parte revogada por Acórdão que decida pela inexistência de qualquer nexo de causalidade.
34. O Tribunal a quo decidiu “fixar em € 220 000, 00 (duzentos e vinte mil euros), o montante indemnizatório dos alimentos (sendo € 180 000, 00, atribuídos à Autora AA, cuja perda de rendimentos abrange cerca de 23 anos ou mais, e € 20 000, 00, a cada um dos Autores BB e CC, com perda de alimentos durante cerca de dois anos), valores que, ainda segundo a expressão do citado acórdão, se nos afiguram adequados a compensar o benefício obtido com a antecipação do capital, tendo também em linha de conta a normal erosão monetária” (sublinhado e negrito nossos).
35. Contudo a sentença a quo enferma nesta parte de erro de julgamento, dado que a matéria dada como provada é insuficiente para a condenação da Recorrente, tendo o Tribunal a quo se substituído aos Autores na alegação de factos constitutivos do seu direito a alimentos e ainda os critérios utilizados na fixação da indemnização não se afiguram acertados.
36. Sem prejuízo da impugnação da matéria de facto alegada no presente Recurso quanto aos pontos provados sob os números 20.º e 23.º da sentença recorrida, entende a Recorrente que não foram alegados pelos Recorridos factos essenciais suscetíveis de justificar a existência de um dano patrimonial efetivo e a consequente atribuição de uma indemnização a título de dano patrimonial futuro, nos termos impostos pelo artigo 495.º, n.º 3 do CC.
37. Efetivamente o direito previsto no artigo 495.º, n.º 3 do CC não é um direito de atribuição automática e direta, e só existirá se (e na medida em que) for demostrada a facticidade em que necessariamente terá de assentar - Neste sentido, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, processo n.º 6/15.5T8VFR.P1.S1, de 03/11/2016, disponível em www.dgsi.pt.
38. No caso dos autos, não existem factos que apontem para os montantes das despesas do agregado familiar com alimentação, vestuário, tratamentos médicos, habitação, nem qual o contributo que, em concreto, os rendimentos de trabalho do falecido EE, tinham para estas despesas.
39. Nos termos do disposto no n.º 1, do artigo 342.º do CC, era aos Recorrentes que competia o ónus da prova dos factos constitutivos do direito a alimentos a que se arrogam – ónus que não cumpriram.
40. Resultando que a sentença recorrida atribui aos Recorridos uma indemnização no termos do artigo 495.º, n.º 3, sem que estes tenham alegado ou sequer provado factos donde decorra uma situação de necessidade de alimentos por parte dos Autores, pressuposto essencial da atribuição de tal indemnização.
41. Nos termos do artigo 495.º, n.º 3, do CC, têm direito a indemnização os que podiam exigir alimentos ao lesado ou aqueles a quem o lesado os prestava no cumprimento de uma obrigação natural, então, deve ter-se em conta o disposto no artigo 2004.º, do CC, do qual resulta que só pode exigir alimentos aquele que se encontre numa situação de necessidade, de dificuldade ou de impossibilidade de auferir ou deter meios de subsistência.
42. Da petição inicial, bem como da prova produzida, conclui-se que os Recorrentes não configuram a sua causa de pedir como uma verdadeira situação de necessidade de alimentos, pelo que falhou a verificação de dois dos pressupostos exigidos nos artigos 495º, nº 3 e 2004º, ambos do CC, quanto à necessidade de alimentos e à impossibilidade dos Recorridos proverem à sua subsistência.
43. A sentença recorrida enferma, assim, de erro de julgamento ao dispensar os  Recorridos da alegação e prova da necessidade de alimentos e da impossibilidade de proverem à sua própria subsistência, na medida em que o artigo 495.º, n.º3, do CC, invocado para o efeito, deve ser interpretado no sentido de exigir a alegação e prova dos pressupostos decorrentes do artigo 2004.º do CC, devendo ser revogada e substituída por Acórdão que julgue insuficiente a alegação dos Recorridos para sustentar o direito a alimentos, por aplicação do artigo 495.º, n.º 3 interpretado conjugadamente com o artigo 2004.º, ambos do CC e, em consequência, julgar o pedido totalmente improcedente, com as demais consequências legais.
44. Acresce que no que respeita aos critérios considerados pelo Tribunal a quo na determinação do quantum indemnizatório atribuído aos Recorridos, resulta da sentença recorrida que para a atribuição da indemnização prevista no artigo 495.º, n.º 3 do CC, foi considerada: a remuneração média mensal do falecido EE; a atribuição de 70% do rendimento destes aos encargos do agregado familiar; 283 meses de vida ativa daquele e a taxa anual de 2% de rendimento do capital.
45. Contudo a remuneração média mensal a considerar para efeitos do cálculo da indemnização, dever ser a retribuição líquida e não ilíquida, como faz a sentença a quo, em cumprimento do que resulta do art.º 562º do CC, pois que apenas essa parte dos rendimentos aproveitaria ao agregado familiar do sinistrado.
46. Para se apurar tal rendimento líquido, ao valor anual considerado de 17.772,30€ (965*14+124,30*11+241,25*12) ao qual corresponde a remuneração mensal de 1.481,025€ terá, necessariamente de se descontar, pelo menos, 11% da taxa contributiva fixa que compete aos trabalhadores dependentes da Segurança Social (equivalente a 162,91€ mensais), a título de quotização nos termos do artigo 11.º, n.º 2 e 53.º, ambos do CCont., apurando-se assim o salário líquido de 1.318,11€, e não de 1.481,025€.
47. Entende, ainda, a Recorrente que como decorre da experiência da vida comum quando o falecido, EE, atingisse a idade da reforma iria, necessariamente, ver diminuídos os seus rendimentos e, em consequência, a sua contribuição a título de prestação de alimentos.
48. Assim, a base de cálculo a considerar para efeito da fixação da indemnização deveria ser os 965*14+124,30*11+241,25*12/12,deduzida de 11% como se alegou, durante 228 meses (período que corresponderia à idade do falecido aquando da sua morte até à idade da reforma, à data fixada em 65 anos nos termos do artigo 20.º Decreto-Lei n.º187/2007, de 10 de maio), e para a base de cálculo do valor correspondente aos restantes 55 meses (período que decorreria entre a idade da reforma e a esperança média de vida) teria necessariamente de ser considerado um valor inferior para refletir a previsível diminuição de rendimentos que sofreria a partir da idade da reforma.
49. De referir ainda que na dita base de cálculo (965,00€*14+124,30€*11+241,25€*12/12) foi considerado o subsídio de alimentação (no montante de 124,30€) que o falecido auferia mensalmente.
50. Contudo, o subsídio de alimentação não integra a retribuição do falecido.
51. Nos termos do artigo 260.º, n.º 2, do Código do Trabalho, o subsídio de refeição não integra o conceito de retribuição, a menos que, na parte que exceda o seu montante normal, tenha sido previsto no contrato de trabalho ou se deva considerar pelos usos como elemento integrante da retribuição do trabalhador.
52. Porém, os Recorridos não produziram qualquer prova no sentido de demonstrar que o subsídio auferido excedia os montantes normais, tal como impõe o artigo 260.º do Código do Trabalho para que se possa atribuir natureza diversa ao subsídio em apreço.
53. Pelo que o artigo 495.º ,n.º 3,do CC, deve ser interpretado no sentido de contemplar apenas o rendimento líquido do sinistrado para o cálculo dos alimentos a arbitrar e, no âmbito deste, apenas considerar os montantes que integram o conceito de retribuição à luz do preceituado no artigo 260.º do Código do Trabalho, daí se excluindo o subsídio de alimentação da base de cálculo em apreço.
54. E bem assim na respetiva aplicação deve ser tida em conta a evolução dos rendimentos do sinistrado em face da diferenciação entre o período expectável de vida profissional ativa e do período remanescente relativamente à esperança média de vida.
55. Por último, para a fixação da obrigação de indemnizar, deve ainda considerar-se o disposto no artigo 570.º do CC que o Tribunal a quo olvidou, ao não contemplar no seu juízo valorativo que o sinistrado, EE, violou a regra de segurança de proibição de circulação por debaixo de cargas suspensas, em face dos trabalhos que decorriam no local e hora do acidente, de que tinha conhecimento – circunstância que, infelizmente, também concorreu para o dano sofrido.
56. A gravidade que encerra o desrespeito das regras de segurança no caso incumpridas pelo lesado justifica que uma redução significativa da indemnização, na ordem de pelo menos 40%.
57. Pese embora a morte ocorrida, e que se lamenta profundamente, a conduta do sinistrado não poderia ter sido completamente desconsiderada pelo Tribunal a quo, como o foi e, em consequência, não poderia ter sido ignorada por este, no seu juízo valorativo, a ponderação da medida da indemnização através da aplicação do disposto no artigo 570.º do CC que impõe a ponderação da culpa do lesado – ao não fazê-lo o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, o que se invoca para sustentar a revogação da sentença recorrida e a sua substituição por Acórdão que pondere tais elementos.”
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Os autores AA, BB e CC contra-alegaram, pugnando pela manutenção da decisão recorrida.
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Em 27.9.2022, NN deduziu pedido de intervenção principal espontânea, associando-se aos autores e fazendo seus os articulados dos mesmos, alegando que é filha e herdeira do falecido EE.
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Por decisão proferida em 17.1.2024, foi admitida a intervenção principal espontânea de NN.
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Notificada do pedido de intervenção de NN, a COMPANHIA DE SEGUROS EMP06... S.A. apresentou requerimento pedindo a ampliação do objeto do recurso, com vista à inclusão do facto superveniente relativo à existência de mais uma filha do sinistrado, tendo formulado as seguintes conclusões (as quais englobam as conclusões já anteriormente apresentadas):

1. O interesse da Interveniente Acessória em recorrer da sentença recorrida, que condena as Rés/seguradas EMP04... e EMP03..., decorre da sucumbência destas nos presentes autos, na medida em que tal sucumbência será a medida, pressuposto e fundamento do direito de reembolso que estas, ao chamar a seguradora a intervir nos autos, declararam pretender exercer em acção ulterior, nos termos do art.º 323º, n.4 do CPC.
2. Nos termos dos art.ºs 631º, n.º1 e 2 do CPC e 20º da CRP e dos critérios jurisprudenciais maioritários sobre a questão da legitimidade do interveniente acessório para recorrer – por todos, Acórdão da Relação de Coimbra, de 20-12-2016, Proc. 359/15.5T8SRT.C1 e o recente acórdão do STJ, de 31-03-2022, Proc. 812/06.1TBAMT.P1.S1 – resultando da sentença recorrida a condenação das Rés/Seguradas da Recorrente, esta tem legitimidade para interpor o presente recurso, requerendo a reapreciação da decisão recorrida e da sucumbência dela decorrente, que será medida e pressuposto do direito de reembolso a exercer contra ela em acção ulterior, ao abrigo da cobertura do contrato de seguro a que aludem os Factos Provados n.ºs 45 e 46 da sentença recorrida.
3. Como decorre sem margem para dúvidas do art,º 31º, 32º e 35º e 37º da Petição Inicial (PI), nada foi alegado e/ou peticionado a título de “falta de contribuição para o sustento” do
4ºA/CC, pelo que a sentença recorrida ao atribuir a este o valor de 20.000,00 Eur por perda de alimentos, condenou além do pedido e, como tal, nessa parte a sentença é nula, devendo ser revogada a condenação das Rés nesse valor ao 2ºAutor/Recorrido, nos termos do art.º 609º, n.º1 do CPC.
4. O Tribunal recorrido fundamenta a condenação das Rés/Seguradas no incumprimento do dever de prevenir o perigo previsto no art.º 160.º do Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil e na consequente violação artigos 5.º, n.º 2, e 3, 7.º, alínea a), e 17.º, alínea b), 20.º e 22.º, n.º 1, alínea a), do Decreto-lei n.º 273/2003, na medida em que considerou que não consta dos factos provados que “os trabalhadores tivessem sido advertidos de que não podiam arremessar os aparelhos provisórios directamente ao solo e fossem vigiados para que tal não ocorresse.”
5. Trata-se de questão que nunca foi especificamente alegada nos autos, em particular pelos Recorridos, a quem, nos termos do art.º 342º do C.Civil, cabia o ónus de alegação e prova da factualidade que pudesse sustentar a alegação, meramente conclusiva, de que o acidente ficou a dever-se a “uma flagrante violação das regras de segurança e de prevenção de acidentes” de segurança e de prevenção de acidentes” – art.º 21º e 26º da PI.
6. Como resulta dos docs. 3, 4 e 5 junto com a contestação da Ré EMP03..., o Tribunal recorrido foi mais longe que a própria ACT e, apenas em sede de sentença, descortinou a tal violação do dever de advertir os trabalhadores, de que os aparelhos provisórios não podiam ser arremessados directamente para o chão, e de os vigiar para que tal não acontecesse, para assim justificar a procedência da acção.
7. Estamos perante uma decisão surpresa, que enferma de nulidade a sentença recorrida, subsumível no na alínea d), n.º1, do art.º 615º do CPC, apenas invocável em sede de recurso da mesma sentença (cf. nesse sentido Prof. Miguel Teixeira de Sousa, Blog do IPPC, 29-11-2016,Jurisprudência(496)Decisão-surpresa;nulidade;investigaçãodapaternidade;caducidade,disponível em https://blogippc.blogspot.com/2016/11/jurisprudencia-496_29.html).
8. O que aqui expressamente se invoca, para os devidos e legais efeitos, porquanto a sentença recorrida é nula, na parte em que fundamenta a responsabilidade das Rés/Seguradas em questão de facto e de direito nunca antes alegada e/ou discutida nos autos, pelo que se impõem a sua revogação e consequente absolvição das rés dos pedidos formulados nos autos.
9. Face à força probatória do assento de nascimento apresentado com o requerimento de intervenção espontânea de NN, resulta provado que esta também é filha da vítima do acidente objecto destes autos, o trabalhador EE, impondo-se a alteração do n.º1 dos Factos Provados da sentença já proferida, quanto à identificação dos legítimos herdeiros da vítima. (ADITADO)
10. Assim ser e querendo que ao elenco dos herdeiros de EE seja aditada a herdeira e interveniente agora conhecida, sugerindo-se a seguinte formulação ao Facto n.º1 da sentença recorrida:“1.º-No dia ../../2012, faleceu o Sr.EE, à data do óbito, casado com a primeira Autora, deixando como únicos herdeiros os Autores e ainda sua filha maior, DD, nascida em ----/----/../../...., cf. habilitação de herdeiros junta com petição que se dá por integralmente reproduzida, e a sua filha menor, NN, nascida em ../../2008, cf. Assento de nascimento junto com requerimento de intervenção desta, que se dá por integralmente reproduzido.”(ADITADO)
11.Sem margem para dúvidas, resulta da prova testemunhal, mas essencialmente documental junta aos autos (doc.... da Petição Inicial, auto de conciliação por acidente de trabalho; doc..../auto de contraordenação da ACT e doc.... e .../decisão que julgou totalmente improcedente aquela contraordenação da contestação da EMP03...; doc. .../ auto de mão de obra n.º 36, junto com a contestação da Ré EMP01...), que o trabalhador FF, à data do acidente que o vitimou, embora estivesse a trabalhar “sob as ordens, direção e fiscalização da Ré EMP04... no exercício das suas funções de carpinteiro de tosco e encarregado, com isenção de horário de trabalho” (Facto Provado n.º2), estava vinculado por contrato de trabalho à Ré EMP01....
12.E foi precisamente na qualidade de entidade empregadora, que a Ré EMP01..., na qualidade de empresa cedente, celebrou um acordo de cedência temporária e que “na sequência do mencionado acordo de cedência ocasional, a EMP01... facturou ao EMP04... o valor correspondente a tais cedências de trabalhadores (…) onde consta, expressamente, como trabalhador cedido (cedência temporária) desde o dia ../../2011, o sinistrado EE (…)”. – cfr. pág. 11/41 da sentença recorrida.
13.Estamos perante um facto - relação laboral entre a vítima/trabalhador e a Ré EMP01.../Empregadora – sobejamente provado pela prova documental junto aos autos e que importa à boa decisão da causa, em particular, para apurar a responsabilidade solidária da entidade empregadora, enquanto empresa cedente, nos termos do art.º 18º da LAT.
14. Pelo que importa aditar tal facto à factualidade provada da sentença recorrida, completando-se o Facto Provado n.º2, sugerindo-se para o efeito a seguinte redação: “2.º - No dia ../../2012, o referido EE sofreu um acidente, quando, em ..., no viaduto sobre a E.N. ...5, no IP..., trabalhava sob as ordens, direção e fiscalização da Ré EMP04... no exercício das suas funções de carpinteiro de tosco e encarregado, com isenção de horário de trabalho, a quem tinha sido cedido pela sua entidade empregadora, a EMP01... S.A., no âmbito de um acordo de cedência temporária de trabalhadores, celebrado entre as duas empresas.”
15.Tal como se consigna na fundamentação da sentença recorrida, “a morte do infeliz EE resultou de ter sido atingido por um dos aparelhos provisórios que os trabalhadores da EMP05..., Pré- Fabricação, S. A. atiraram directamente para o solo, desde a plataforma onde executavam os trabalhos de remoção dos aparelhos, (…).” – pág. 22/41 da sentença.
16.Para que a eclosão do acidente ocorrido em sede laboral possa ser atribuída à violação de regras de segurança pelo empregador, ou pessoa responsável pelo seu cumprimento, é necessário que se verifique a violação de uma regra ou norma concreta sobre segurança no trabalho, não bastando a violação de regras genéricas ou programáticas sobre esta segurança, para que se dê como preenchida a previsão do nº 1 do artº 18º da LAT ou até o tipo legal de crime p.p. no art.º artigo 152.º-B, n.ºs 1, 2 e 4, alínea b), do Código Penal – a título meramente exemplificativo da jurisprudência unânime neste sentido, Acórdão da Relação de Coimbra, de 30-11-2017, Proc. 45/11.5TTCLD.C1.
17.Não existe, e não foi elencada no vasto acervo legislativo em que se fundamenta a sentença recorrida nesta matéria, qualquer norma que, para prevenção do risco previsto no art.º160º do Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil, obrigue o Empregador a advertir especificamente os trabalhadores de que quaisquer objectos utilizados em trabalhos em altura, serão arriados com cuidado e nunca arremessados directamente, e de os vigiar, para que tal não aconteça.
18.As Rés/Seguradas cumpriram com os deveres que decorrem do art.º, 15º, n.º1 e 2 da Lei 102/2009, identificando e prevenindo os riscos decorrentes da remoção dos apoios em altura, a que alude o art.º 160º do Regulamento da Construção Civil, ao planificarem a organização do trabalho mediante os procedimentos que resultam dos factos provados 12 a 15, de tal maneira que aqueles trabalhos, constituíam “TAREFA SIMPLES E SEM QUALQUER RISCO, SE EFETUADA COM OBSERVÂNCIA DAS REGRAS A QUE TAL TRABALHO ESTAVA SUJEITO”. – Facto Provado n.º16 – assim “combatendo os riscos na sua origem, por forma a eliminar ou reduzir a exposição e aumentar os níveis de protecção (…). – alª. e) do n.º2, art.º 15º da Lei 102/2009.
19.Como está provado, as Rés/Seguradas também cumpriram com o dever de “combater o risco na sua origem, diminuindo a exposição e aumentando a segurança”, elaborando e executando “o Plano Específico de Segurança (“PES”) para Montagem de Estruturas Pré-Fabricadas para Tabuleiros (Vigas e Pré-Lajes) – OAE’s, bem como as Fichas de Prevenção de Riscos FPR023A02  (Movimentação Manual de Cargas) e FPR028A02 (Movimentação Mecânica de Cargas)” (Facto Provado n.º47), que distribuíram à Ré EMP05..., ao serviço de quem se encontravam os trabalhadores que removeram o apoio que atingiu a vítima, entidade “a quem cabia proceder à respectiva divulgação pelos seus colaboradores e subempreiteiros, conforme consta dos Comprovativos de Distribuição, assinados, respectivamente, a 18 de Agosto de 2010 e a 17 de Novembro de 2011.” (Factos Provados n.ºs 48 e 49).
20.Mas as Rés/Seguradas não se bastaram com a divulgação dos planos de segurança e execução dos trabalhos, já que “para além da referida divulgação obrigatória, todos os trabalhadores afectos à obra em questão foram alvo de formações de acolhimento e específicas, nas quais foram sensibilizados para os vários riscos e precauções envolvidos”. (Factos Provados n.º50 e 51), o que inclui os riscos decorrentes dos trabalhos de movimentação mecânica de carga, como os apoios provisórios removidos em altura, identificados no PPS e Fichas de Prevenção de riscos.
21. Em particular, “houve lugar a diversas formações específicas para a movimentação manual de cargas e para a movimentação mecânica de cargas: em particular, refira-se que os funcionários da EMP05... GG e HH estiveram presentes nas sessões de formação, o primeiro na ocorrida em 19 de Dezembro de 2011 e o segundo nas sessões ocorridas em 19 de Dezembro de 2011 e 30 de Dezembro de 2011.” (Facto Provado n.º52).
22. Foi ainda assegurado que “o PSS, o PES e as Fichas de Prevenção de Riscos Relativas à Movimentação Manual de Cargas e à Movimentação Mecânica de Cargas foram entregues ao trabalhador sinistrado (Sr. EE), bem como aos trabalhadores envolvidos nos trabalhos de remoção manual dos apoios provisórios (trabalhos que, como vimos, estavam em execução na altura do acidente).” (Facto Provado n.º53).
23.Importa ainda realçar que “o trabalhador sinistrado e os trabalhadores que procediam aos trabalhos de remoção manual dos apoios provisórios – assim como todos os restantes – estavam perfeitamente cientes das obrigações decorrentes da necessidade de assegurar, a todo o tempo, o cumprimento do plano de segurança”, no qual se enquadravam os procedimentos de remoção de apoios, o que “CONSTITUÍA TAREFA SIMPLES E SEM QUALQUER RISCO, SE EFETUADA COM OBSERVÂNCIA DAS REGRAS A QUE TAL TRABALHO ESTAVA SUJEITO”. – (Facto Provado n.º16) – o que era ainda assegurado por mecanismos de segurança na plataforma dos trabalhos de remoção dos apoios, que “dispunha de guarda corpos, mas também de rodapés, destinados a evitar a queda de materiais pousados nessa plataforma” (Facto Provado n.º.56).
24.Perante toda esta factualidade provada e que integra a sentença recorrida, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao fundamentar a responsabilidade das Rés/Seguradas, por terem omitido o dever de evitarem o risco previsto no art.º 160º do RCC, ao não terem  cumprido com um especifico dever de advertência e vigilância dos trabalhadores, na remoção dos apoios provisórios em altura.
25. O acidente que vitimou o pai e marido dos Recorridos não ficou a dever-se à violação (por omissão) das regras de segurança pelas Rés/Seguradas, ou porque, como conclui o Tribunal a quo, “não teria ocorrido, se os trabalhadores tivessem sido advertidos de que não podiam arremessar os aparelhos provisórios directamente ao solo e fossem vigiados para que tal não ocorresse”. – pág. 34/41 sentença recorrida.
26.Bem pelo contrário: o acidente em causa ficou a dever-se à violação, sem causa justificativa, das regras de segurança previstas e implantadas na obra e a que estava sujeito o trabalho em curso(FactoProvado16),pelos trabalhadores da EMP05..., que executavam a tarefa de remoção dos apoios provisórios, motivados pelo facto de que “era sexta-feira, o chefe II não estava na obra, acabado o trabalho de remoção dos aparelhos, não havia outros trabalhos para realizar, pelo que, se fossem rápidos, poderiam ir de fim-de-semana e almoçar a casa (cf. depoimento da testemunha II)”. – sic sentença recorrida.
27. Fizeram-no com culpa e conscientes de que violavam as normas de segurança impostas para a execução da tarefa que tinham em curso, já que “o trabalhador sinistrado e os TRABALHADORES QUE PROCEDIAM AOS TRABALHOS DE REMOÇÃO MANUAL DOS APOIOS PROVISÓRIOS – ASSIM COMO TODOS OS RESTANTES – ESTAVAM PERFEITAMENTE CIENTES DAS OBRIGAÇÕES DECORRENTES DA NECESSIDADE DE ASSEGURAR, A TODO O TEMPO, O CUMPRIMENTO DO PLANO DE SEGURANÇA.” (Facto Provado n.º 54, nosso sublinhado).
28.Concorreu também para a eclosão do acidente a culpa da vítima, o Sr. EE, que exercia as funções de Encarregado da obra (Facto Provado n.º2), a quem “O PSS, o PES e as Fichas de Prevenção de Riscos Relativas à Movimentação Manual de Cargas e à Movimentação Mecânica de  Cargas foram entregues ao trabalhador sinistrado (Sr. EE), bem como aos trabalhadores envolvidos nos trabalhos de remoção manual dos apoios provisórios (trabalhos que, como vimos, estavam em execução na altura do acidente).” (Facto Provado n.º 53).
29.Estando provado também que estava “(…) perfeitamente cientes das obrigações decorrentes da necessidade de assegurar, a todo o tempo, o cumprimento do plano de segurança” (Facto Provado n.º54), nomeadamente e ao que agora importa, “Impedir a circulação de pessoas e equipamentos debaixo de cargas suspensas”. (Factos Provados 41 e 42).
30.E porque estavam em curso trabalhos de remoção de apoios provisórios em altura, foi implementada a medida de segurança prevista para evitar os riscos daí decorrentes, já que “o acesso/circulação na parte da obra em apreço estava condicionado por PMB (Perfis Móveis de Betão), redes Bekaert e sinalização, só havendo entrada com autorização dos encarregados” (Facto Provado n.º43), como era o caso da vítima.
31.O nosso ordenamento jurídico, no art.º 563º do C. Civil consagra a teoria da causalidade adequada na sua formulação negativa, ou seja, perante tal entendimento, é necessário demonstrar que, se tivessem sido adoptadas as medidas de prevenção/segurança implementadas na obra pelas Rés/Seguradas, o acidente não teria ocorrido.
32. O que resulta provado nos autos, já que se o apoio provisório tivesse sido removido conforme as regras a que tal trabalho estava sujeito, era uma tarefa simples e segura (Facto n.º16), teria sido removido por via da utilização da grua (Factos Provados 12 a 15) e nunca teria sido arremessado manualmente e directamente para o chão, a partir de uma altura de 35 metros.
33.Por outro lado, se a vítima, o Sr. EE, não estivesse a circular no local onde foi atingido pelo apoio provisório, numa zona cujo acesso estava vedado por obstáculos e sinalização, que necessariamente teve de transpor para aceder ao local do acidente, em total violação das normas de segurança previstas, informadas e implementadas na altura do acidente (Facto Provado n.º 42 e 43),
34. e que integravam o Plano de Segurança e Saúde em obra, o Plano Específico de Segurança:  “Montagem de Estruturas Pré-Fabricadas para Tabuleiros (Vigas e Pré-Lajes) e na Ficha de Prevenção de Riscos (FPR 369-A) do Plano (Factos Provados 40º a 42º), o acidente que o vitimou não teria ocorrido, assim também contribuindo com culpa sua para a ocorrência do acidente que o vitimou.
35.Assim, em obediência à boa aplicação do art.º 563º do C. Civil e da teoria da causalidade adequada na sua formulação negativa, impõem-se rectificar o entendimento que enferma de erro de julgamento, vertido na sentença recorrida, concluindo-se antes que o acidente não teria ocorrido, se os trabalhadores da EMP05... e a vítima mortal tivessem cumprido com as normas de segurança que foram implementadas na obra.
36. A actuação das Rés/Seguradas não é subsumível no nº 1 do artº 18º da LAT (Lei 98/2009, de 04/09), nem na previsão do tipo legal de crime p.p. no art.º 152.º-B, n.ºs 1, 2 e 4, alínea b), do Código Penal, já que da matéria de facto provada nos autos não resulta que tenham violado uma regra ou norma concreta sobre segurança no trabalho e, por outro lado, resulta que o acidente dos autos ocorreu precisamente por não terem sido respeitadas as normas de segurança implementadas na obra, pelos trabalhadores da EMP05... e pela própria vítima.
37. Concluindo-se, assim, pela PRESCRIÇÃO DO DIREITO DOS RECORRIDOS, já que não tendo ocorrido a violação de normas de segurança pelas Rés/Seguradas, não se justifica a aplicação do prazo de prescrição de 10 anos, por não se verificar qualquer acção integradora do tipo legal de crime p.p. no art.º. 152.º-B, n.ºs 1, 2 e 4, alínea b), do Código Penal, sendo aplicável o prazo de 3 anos, previsto no art.º 498º, n.º1 do C. Civil, há muito esgotado quando concretizada a citação das Rés/Seguradas, por ofícios de citação de 13/02/2017.
38. Nesta matéria o Tribunal recorrido também foi além do alegado pelos Recorridos, que não invocaram factos suceptiveis de, especificamente, integrarem qualquer tipo legal de crime, que pudesse fundamentar a aplicação de prazo de prescrição mais longo, nos termos do artº. 498º, n.º3 do C. Civil, pelo que, também por essa razão, o prazo de prescrição a considerar é o de 3 anos, previsto no n.º1 daquela norma.
39. O que expressamente se invoca para os devidos e legais efeitos, impondo-se a imediata absolvição das Rés/Seguradas dos pedidos, nos termos do art.º 576º, n.º3 do CPC.
40. Qualquer direito de que a Interveniente NN, filha da vítima, pudesse ser legitima titular, face à sua qualidade de herdeira da vítima do acidente obejcto dos autos que resulta provada, encontra-se há muito prescrito, porquanto, considerando que aquele acidente ocorreu a ../../2012, à data em que a intervenção foi suscitada e posteriormente notificada às partes, já se encontravam esgotados todos os prazos de prescrição, nomeadamente, o mais lato de 10 anos, que decorre da fundamentação da sentença já proferida nos autos. (ADITADO)
41.Ao julgar a acção parcialmente procedente, o Tribunal recorrido fez má aplicação do direito à factualidade que resulta provada na sentença recorrida, nomeadamente, dos art.º 18º, n.º1 da LAT e art.º 152.º-B, n.ºs 1, 2 e 4, alínea b), do C.P., 160.º do Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil, bem como das normas previstas nos artigos 483º,486º,563ºe570ºdoC. Civil, incorrendo em erro de julgamento, ao invocar e subsumir a factualidade provada na previsão das normas citadas na sentença recorrida, assim se  impondo a absolvição das Rés/seguradas dos pedidos contra elas formulados, julgando-se em relação a estas a acção totalmente improcedente.
42. Os Recorridos sustentam asua pretensão contra TODAS as Rés, invocando apenasa violação de regras de segurança no trabalho e, consequentemente, convocam APENAS o art.º 18º da LAT, sem nunca invocarem outras normas ou fontes de responsabilidade de natureza civil, como seria a responsabilidade civil extracontratual da dona da obra – cfr. art.º 26º da PI.
43.No entanto, a sentença recorrida justifica a condenação Ré EMP03..., enquanto dona da obra, “nos termos gerais, pela inobservância dos seus deveres de planeamento da segurança e fiscalização (vide acórdão do STJ de 09-07-2015, proferido na Revista n.º 102/05.7TVLSB.E1.S1, em parte citado no acórdão do STJ de 22-06-2021, in sítio da Net do IGFEJ), nos termos do disposto nos artigos 483.º e 486.º do Código Civil”. – cfr. sentença recorrida.
44. Mais uma vez e com o devido respeito, se afigura que a sentença recorrida padece de nulidade, ao condenar em objecto diferente do pedido e ao conhecer de questão que não foi suscitada, já que os Recorridos não deduziram nenhuma pretensão contra a Dona da Obra nos termos gerais, suscitando a questão da violação do dever de vigilância que decorre do art.º1209º do C.Civil, pela inobservância dos seus deveres de planeamento da segurança e fiscalização, mas apenas fundamentaram a sua pretensão na violação de regras de segurança no trabalho e no art.º 18º, n.º1 da LAT.
45. O Tribunal recorrido não podia condenar a dona da obra nos termos gerais da responsabilidade civil extracontratual, pela inobservância dos seus deveres de planeamento da segurança e fiscalização, como resulta da sentença recorrida, pelo que não podendo fundamentar-se a condenação da EMP03... ao abrigo do art.º 18º, n.º1 da LAT, como peticionado, impõem-se a sua imediata absolvição do pedido.
46. Sem prescindir, dos factos provados nos n.ºs12 a 16, 38 a 43 e 47 a 56d a sentença recorrida, conclui-se que a Dona da Obra cumpriu com os deveres de controle, direcção e supervisão técnica da obra, empregando todas providências exigidas pelas circunstâncias, para prevenir o risco dos trabalhos em altura, ficando o acidente a dever-se à violação das regras de segurança implementadas na obra pelos trabalhadores da EMP05... e pela vítima.
47. Apesar de se encontrar cedido temporariamente à EMP04..., para trabalhar “sob as ordens, direção e fiscalização da Ré EMP04... no exercício das suas funções de carpinteiro de tosco e encarregado, com isenção dehorário de trabalho” (FactoProvado n.º2), avítima EE era trabalhador e estava vinculado à Ré EMP01..., por via de um contrato de trabalho celebrado entre ambos.
48. Concluindo o Tribunal recorrido que o acidente que vitimou um trabalhador da Ré EMP01..., cedido temporariamente à EMP04..., ocorreu por ter sido violado (por omissão) o dever de assegurar as regras de segurança no trabalho, então impunha-se igualmente a condenação, solidária, da entidade empregadora/empresa cedente do trabalhador vitimado pelo acidente dos autos, nos termos do art.º 18º da LAT – neste sentido, acórdão da Relação do Porto, de 20-02-2018, Proc. 295/14.2TTVRL.P1.
49. Ao absolver a Ré Entidade Empregadora da vítima, o Tribunal incorreu em erro de julgamento, fazendo má aplicação do art.º 18º, n.º1 da LAT, pelo que, a manter-se a decisão recorrida – o que se equaciona por dever de patrocínio – impõe-se revogar a sentença recorrida na parte em que absolveu a EMP01... S.A., entidade empregadora e empresa cedente do trabalhador sinistrado, e a sua Seguradora, a Recorrida EMP02..., por outra decisão que condene a EMP01... e a sua seguradora, ao abrigo da cobertura dos contratos de seguro que constam dos Factos  Provados n.ºs 29 ou 30, solidariamente, no pagamento de todas as quantias devidas ao Recorridos, o que expressamente se requer.
50.Com base nos Factos Provados no n.º1 da sentença recorrida, o valor de 60.000,00 Eur fixado na sentença recorrida pelo dano morte da vítima, cabia, assim, em conjunto a TODOS os herdeiros da vítima, incluindo a filha DD, que não é Autora nesta acção, e a filha NN, cujo direito se encontra prescrito, pelo que a proporção daquele valor que lhes era devida, por direito próprio, não acresce e não pode ser atribuída aos Recorridos – neste sentido, cfr. o Acórdão da Relação do Porto, de 12-12-2006, Proc.0626394. (ADITADO)
51. Assim e como impõe a boa interpretação e aplicação do art.º 496º, n.º2 do C. Civil, segundo o entendimento jurisprudencial maioritário actual, o valor a atribuir aos Recorridos, em igual proporção, pelo dano morte, há-de ser fixado em pelo dano morte, há-de ser fixado em 36.000,00Eur (trinta e seis mil euros), deduzindo-se ao valor de 60.000,00 Eur já fixado, a proporção de 24.000,00Eur (60.000,00Eur/5 Herdeiros = 12.000,00Eur) que, por direito próprio, caberia às filhas e herdeiras DD e NN.(ADITADO)
52. Como resulta do auto de conciliação junto como doc. ... da PI, no processo por Acidente de Trabalho, que correu termos pelo Tribunal de Trabalho de Penafiel, Proc. 376/12...., foi atribuída uma pensão anual e vitalícia à Viúva e Filho BB e ao Filho CC, até atingir 18/22 ou 25 anos, segundo os mesmos critérios a que se atendeu na sentença recorrida para chegar ao valor da indemnização pelo dano patrimonial futuro, ou seja a remuneração de € 965 x 14 + 124, 30 x 11 + 241,25 x 12 : 12 = € 1 481, 025 – Facto Provado n.º2.
53. Tal como se encontra fundamentada a sentença recorrida, fazendo uma concretização da alegação conclusiva que estrutura toda a causa de pedir fundamentada “na flagrante violação das regras de segurança e prevenção de acidentes por parte dos trabalhadores” – art.º 21º da PI – a condenação das Rés/Seguradas sustenta-se na violação (por omissão) das regras de segurança exigíveis na execução dos trabalhos de remoção de apoios provisórios – artigo 160.º do Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil, artigos 5.º, n.º 2 e 3, 7.º, alínea a), 17.º, alínea b), 20.º e 22.º, n.º 1, alínea a) do Decreto-lei n.º 273/2003, 18º, n.º1 da LAT e até o crime p.p. no art.º 152.º-B, n.ºs 1, 2 e 4, alínea b), do Código Penal, para julgar improcedente a excepção da prescrição invocada.
54. Neste contexto, atendendo ao pedido formulado na PI e aos fundamentos a que a sentença recorrida alude para atribuir o valor de 220.000,00 Eur (fundamentos legais e retribuição da vítima considerada), estamos perante a indemnização do mesmo dano já indemnizável em sede laboral, com a atribuição de pensões aos recorridos, por morte da vítima de Acidente de Trabalho.
55. Não sendo devida qualquer indemnização nestes autos, porque não há dano a indemnizar aqui, pois o MESMO DANO - fixado com base nos mesmos pressupostos legais e factuais/remuneração - já foi indemnizado em sede de AT, impondo-se, assim, a absolvição das Rés/Seguradas do pedido nesta parte e no pagamento do valor de 220.000,00Eur, atribuído pelo dano patrimonial futuro decorrente da morte da vítima - em defesa deste entendimento invoca-se a decisão vertida no Acórdão da Relação de Évora, de 12-05-2022, Proc. 1956/18.2T8TMR.E1. Sem prescindir,
56. Na sentença recorrida considerou-se o valor da remuneração ilíquida da vítima, resultante do auto de conciliação de Acidente de Trabalho (€ 965 x 14 + 124,30 x 11 + 241,25 x 12 : 12= €1.481, 025 anuais), para se chegar ao valor de 220.000,00 Eur atribuído por este dano aos Recorridos.
57. Assim, caso se mantenha a final o valor de 220.000,00Eur já fixado para este dano em sede de sentença, então o valor de 180.000,00Eur fixado à Recorrida viúva, atendendo a que iria recebê-lo durante cerca de 23 anos, deverá ser reduzido para metade, fixando-se equitativamente o valor da indemnização que caberia a cada uma das pessoas que poderiam beneficiar do rendimento futuro da vítima nas seguintes proporções: viúva 90.000,00Eur; filha NN, nascida em ../../.... e com 4 anos à data do sinistro, 90.000,00Eur, €20 000, 00, a cada um dos Autores BB e CC. (ADITADO)
58.Estando prescrito o direito da filha NN, o valor de 90.000,00Eur a que esta teria direito a receber pela perda do rendimento futuro do pai, sendo um direito próprio daquela, não acresce para os restantes Autores/Recorridos, mas deve ser deduzido ao valor final.  (ADITADO)
59.E caso os critérios da douta sentença se mantenham, então, o valor final a fixar para indemnização do dano patrimonial futuro dos Autores Recorridos, pela perda de rendimento do falecido pai, deve ser fixado no valor final 130.000,00Eur (cento e trinta mil euros), cabendo 90.000,00Eur à viúva e €20 000, 00, a cada um dos Autores BB e CC. (ADITADO)
60.Mas caso se entenda que para se apurar a indemnização por este dano patrimonial, deve-se atender ao rendimento líquido, pelo que ao valor da remuneração base de 965 Eur x 14 meses terá de se descontar11%(=106,15Eur), relativo à taxa paga por qualquer trabalhador dependente para a Segurança Social, apurando-se assim o salário líquido de 858,85 Eur, do qual a vítima entregaria mensalmente 70% para assegurar despesas do agregado familiar (= 601,19Eur).
61. Seguindo o critério de cálculo da sentença recorrida, nos 283 meses de vida activa da vítima, esta entregaria no final desse período o valor de 170.136,77 Eur, ao qual se deverá deduzir uma percentagem de cerca 10%, que os critérios jurisprudenciais aplicam, considerando que aquele valor vai ser pago de imediato.
62. Se considerarmos a taxa actual média de remuneração dos depósitos a prazo é de cerca 1% ao ano (considerando a taxa de juro média actual para depósitos de particulares é de 0,07%, segundo o Banco de Portugal, in boletim informativo disponível emhttps://bpstat.bportugal.pt/conteudos/noticias/1722), justifica-se a aplicação de uma redução de 10% do valor que só seria recebido ao fim de 23 anos (durante os quais o valor pode ser anualmente rentabilizado, no mínimo, à taxa anual do juro para depósitos a prazo), assim se apurando o valor final de 153.123,10 Eur (170.136,77 – 10% = 17.013,67/).
63. Considerando que a Autora viúva e a filha menor NN iriam receber a contribuição do rendimento futuro da vítima por um período de tempo similar, justifica-se atribuir o valor final apurado de 153.123,10Eur na proporção de 20.000,00Eur para o Autor CC (já que nada foi pedido para oautor BB) e o remanescente de 133.123,10Eur seria repartido em igual proporção pela Autora Viúva e a filha NN, cabendo a cada uma o valor de 66.561,55Eur.
64. Mas atenta a prescrição do direito desta última, o valor da indemnização final a fixar nestes autos pelo dano patrimonial decorrente da morte da vítima, será de 86.561,55Eur, cabendo 20.000,00Eur ao filho CC e o remanescente de 66.561,55Eur à Autora/recorrida viúva. (ADITADO)
65.Mais se deduzindo-se, como já decidido em função do que foi expressamente peticionado pelos Recorridos, os valores que estes efectivamente venham a receber pela pensão arbitrada no processo emergente de Acidente de Trabalho, mas sem o limite máximo de  €133564,89, porquanto, sendo “incertos e não provados os montantes que os Autores irão receber da seguradora responsável pela pensão arbitrada no processo n.º ...12...” – cfr.. sentença recorrida – não se pode fixar um limite máximo, que pode ser ultrapassado, quando tais valores venham a ser especificamente liquidados e pagos aos Recorridos.
66. Nestes termos e nos melhores de direito aplicáveis, invocando-se a boa aplicação das  normas legais e dos critérios jurisprudenciais supra enunciados, ou outros melhor aplicáveis, sempre com o douto suprimento de V. Excªs, o presente recurso deve ser julgado procedente, por provado, nos termos supra expostos, revogando-se a sentença recorrida, na parte em que condenou as Rés/Seguradas EMP04... e EMP03..., por douto acórdão que absolva estas entidades Seguradas da Recorrente de todos os pedidos contra elas formulados.”
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Em 17.11.2023 foi proferido despacho (ref. Citius 25547754), cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, o qual indeferiu as nulidades da sentença invocadas pelas recorrentes EMP03..., S.A. e Companhia de Seguros EMP06..., S.A.
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Os recursos foram admitidos na 1ª instância como de apelação, a subir imediatamente nos próprios autos, com efeito devolutivo, não tendo sido objeto de alteração neste Tribunal da Relação.
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Foram colhidos os vistos legais.

OBJETO DOS RECURSOS

Nos termos dos artigos 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do CPC, o objeto do recurso está delimitado pelas conclusões contidas nas alegações do recorrente, estando vedado ao Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso, sendo que o Tribunal apenas está adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para o conhecimento do objeto do recurso.
Nessa apreciação, o Tribunal de recurso não tem que responder ou rebater todos os argumentos invocados, tendo apenas de analisar as “questões” suscitadas que, por respeitarem aos elementos da causa, definidos em função das pretensões e causa de pedir aduzidas, se configurem como relevantes para conhecimento do respetivo objeto, excetuadas as que resultem prejudicadas pela solução dada a outras.
Por outro lado, o Tribunal não pode conhecer de questões novas, uma vez que os recursos visam reapreciar decisões proferidas e não analisar questões que não foram anteriormente colocadas pelas partes.

Neste enquadramento, as questões relevantes a decidir, elencadas por ordem de precedência lógico-jurídica, são as seguintes:

I – saber se a sentença padece de nulidade;
II – saber se o direito dos autores se encontra prescrito;
III – na hipótese negativa, saber se a matéria de facto deve ser alterada;
IV – saber se se se verificam os pressupostos legais de que depende a obrigação de indemnização por parte das rés;
V – na hipótese positiva, aferir da correção de fixação dos montantes indemnizatórios

FUNDAMENTAÇÃO

FUNDAMENTOS DE FACTO

Na 1ª instância foram considerados provados os seguintes factos, que aqui se transcrevem nos seus exatos termos:

1.º - No dia ../../2012, faleceu o Sr. EE, à data do óbito, casado com a primeira Autora, deixando como únicos herdeiros os Autores e ainda sua filha maior, DD, cf. habilitação de herdeiros junta com petição que se dá por integralmente reproduzida.
2.º - No dia ../../2012, o referido EE sofreu um acidente, quando, em ..., no viaduto sobre a E.N. ...5, no IP..., trabalhava sob as ordens, direção e fiscalização da Ré EMP04... no exercício das suas funções de carpinteiro de tosco e encarregado, com isenção de horário de trabalho.
3.º - No âmbito do Proc. 376/12.... do ... Juízo do Tribunal do Trabalho de Penafiel, ficou a constar do auto de conciliação que a vítima auferia o salário de € 965 x 14 + € 124,30 x 11 + € 241,25 x 12.
4.º - A obra em cuja realização ocorreu o sinistro pertencia à 2ª Ré (EMP03...);
5.º - Sendo que esta (2ª ré) adjudicou a sua realização, através de empreitada, à EMP04.../3ª Ré e esta última, por sua vez, subcontratou com a EMP05..., Pré-fabricação S.A/4ª Ré.
6.º - O acidente ocorreu em momento em que o Sr. EE se encontrava a conduzir uma viatura sob o viaduto, junto ao pilar 6 (seis).
7.º - No momento em que o Sr. EE aí passava, foi inopinadamente surpreendido pela queda de um aparelho de apoio provisório de betão - de seguida apenas apoio provisório, com, pelo menos, 150 kg de peso, a cair de uma altura de cerca 35 metros, em cima do tejadilho da viatura.
8.º - O referido apoio provisório embateu contra o tejadilho da viatura, amassando-o e fazendo-o ceder/baixar de nível, de forma violenta, contra a cabeça do Sr. EE, causando-lhe as lesões descritas no relatório de autópsia, as quais acabaram por lhe provocar a morte.
9.º - Os apoios provisórios - de que é exemplo o apresentado a fls. 42 (doc. ...3) - são, em substância, caixas/peças metálicas com forma retangular, integralmente preenchidas com betão;
10.º - Com cerca de 75 centímetros de comprimento por 40 cm de altura e com a base, que efetivamente apoia, com cerca de 25 cm.
11.º - Que possuem duas pegas metálicas, colocadas próximo do limite superior, que se destinam a facilitar o seu manuseamento.
12.º - A sua movimentação é efetuada por dois homens - cada um agarra de um dos lados do apoio provisório e, em concertação de esforços, tombam-no para cima das tábuas e fazem-no deslizar até à plataforma.
13.º - De referir que o concreto apoio provisório que, passe a expressão, causou a morte da vítima, encontrava-se, relativamente ao posicionamento inferior do pavimento da plataforma, a apenas 60 cm de altura.
14.º - Uma vez tombado sobre si próprio, o apoio provisório efetua uma deslocação oblíqua e curta, de cerca de um metro, e com um grau de inclinação pouco acentuado.
15.º - Em momento algum os dois homens que deslocam o apoio provisório, do local donde precisa de se deslocar até ficar em condições de ser pegado pela grua, carecem de o levantar com a força braçal; isto é, até ser pegado pela grua, o apoio provisório está com a sua base primeiro apoiada nas tábuas em que desce e, de seguida, na plataforma.
16.º - A sua deslocação, do local em que se encontrava posicionado até ao pavimento da plataforma, constituía tarefa simples e sem qualquer risco, se efetuada com observância das regras a que tal trabalho estava sujeito.
17.º - Dado o peso e a sua forma, o dito apoio provisório jamais podia ter ido para além do espaço da plataforma, só sendo concebível a sua queda para o solo com a ajuda dos trabalhadores que procediam à sua remoção.
18.º - Na verdade, o arremesso do apoio provisório, do local onde ele se encontrava, para a plataforma, e desta, diretamente para o solo, foi apenas mais um arremesso semelhante aos que antes haviam sido efetuados.
19.º - O Sr. EE nasceu em ../../1965.
20.º - A 1ª A./viúva, como doméstica que era, e continua a ser, e seus filhos (2º e 3º AA.), viviam, à data do infeliz evento, em exclusivo, do rendimento do trabalho do Sr. EE.
21.º - O Sr. EE, que mantinha com a A. uma sólida, amiga e confiante relação conjugal, após receber a retribuição, entregava à 1ª A. cerca de 70% da sua totalidade.
22.º - Com o valor recebido a 1ª A. e o Sr. EE faziam face aos gastos diários de cada um e ao sustento geral da demais família, com custo acrescido devido à gravíssima deficiência física do 2º A./BB.
23.º -  A morte do Sr. EE privou, assim, os AA. de meios de regular e adequada subsistência, tendo os mesmos passado a sobreviver com carências que, até então, desconheciam.
24.º -  À data do óbito o Sr. EE era saudável, vivia com alegria, que era estimado por familiares e amigos e devotava à esposa e filhos muita amizade, atenção e carinho.
25.º - Os AA. sofreram intensamente desde a data em que tiveram conhecimento de que o EE - marido e pai - havia sofrido acidente mortal,
26.º - Sofrimento que se manteve intenso durante todo o dia da morte, no dia do funeral e nos dias seguintes e mais próximos;
27.º - Sendo certo que ainda hoje mantêm, e vão continuar a manter por muito mais tempo, profundo desgosto e pesar;
28.º - Sentimento que se acentua nas datas festivas, a saber, aniversários, Natal, Páscoa.
29.º - Aquando da infeliz ocorrência dos presentes autos, encontravam-se em vigor duas apólices de seguro celebradas entre as 1ª e 2ª Rés:
a. Seguro do ramo de Acidentes de Trabalho (AT), titulado pela apólice nº ...00, no âmbito da qual a ora Contestante assumiu a responsabilidade pela reparação dos danos resultantes para os Autores e se encontra a pagar as devidas pensões, de acordo com a Lei dos Acidentes de Trabalho e com o vencimento mensal que, na altura, se encontrava transferido para a Ré EMP02...; e
b. Seguro de Responsabilidade Civil (RC), titulado pela apólice nº ...01, que cobria o risco da ocorrência de danos causados a terceiros no exercício da actividade da 1ª Ré.
30.º - Associada a essa apólice de seguro RC existe uma franquia no montante de € 2 493, 99.
31.º - De acordo com o artigo 2º das Condições Gerais, o contrato “tem por objecto a garantia da responsabilidade civil que, ao abrigo da Lei, seja imputável ao Segurado exclusivamente na qualidade ou no exercício da actividade expressamente referida nas Condições Particulares…”.
32.º - Encontram-se expressamente excluídos da cobertura os danos:
a. “Causados aos empregados, assalariados ou mandatários do Segurado, quando ao serviço deste, desde que tais danos resultem de acidente enquadrável na legislação sobre Acidentes de Trabalho”; e,
b. “Que devam ser garantidos ao abrigo de seguros obrigatórios”; e
c. “Resultantes de lucros cessantes, paralisações de actividade e perdas indirectas de qualquer natureza”.
33.º - A Ré EMP03..., S. A. é a sociedade a quem foi adjudicada  pela então designada EMP08..., S.A. a subconcessão para a conceção, projeto, construção, aumento do número de vias, financiamento, exploração e conservação, do lanço de autoestradas e conjuntos viários associados, designada por Subconcessão Autoestrada ....
34.º - No âmbito da referida Subconcessão, a Ré EMP03..., S. A. contratou o EMP04..., ACE, um Agrupamento Complementar de Empresas para, nos termos do Contrato de Projecto e Construção, realizar a conceção, projeto, duplicação e construção das vias, conforme previsto nos números 27 e ss. do Contrato de Subconcessão, Contrato de Projecto e Construção, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os devidos efeitos.
35.º - A cláusula 22.ª do referido Contrato de Projeto e Construção determina que “salvo estipulação em contrário, o ACE suportará e será o responsável pela reparação e indemnização, nos termos gerais de direito, por todos os danos que devido a razões imputáveis à actividade que leve a cabo no âmbito do Contrato sejam impostos a terceiros, incluindo a que resulte de acções do pessoal ou dos seus subempreiteiros e fornecedores, bem como devido à execução defeituosa ou falta de condições de segurança das obras, materiais e equipamentos”.
36.º - Refere o n.º 5 e 6 da referida cláusula 28.ª que “A execução, por Empreiteiros Independentes, de qualquer obra ou trabalho que se inclua nas actividades integradas na Subconcessão deverá respeitar a legislação nacional e comunitária aplicável”, sendo que “Constitui especial obrigação do ACE promover e exigir de todas as entidades que venham a ser contratadas para o desenvolvimento de actividades objecto deste Contrato a observância de todas as regras de boa condução das obras ou trabalhos em causa e a implementação de especiais medidas de salvaguarda da integridade física do público e de todo o pessoal afecto aos mesmos”.
37.º - No âmbito da referida Subconcessão, a Ré contratou também a EMP09..., S. A., para realizar a fiscalização em obra, tendo nomeado tal empresa como coordenador em matéria de segurança e saúde durante a realização da obra nos termos e para os efeitos previstos no Decreto-Lei n.º 273/2003, de 29 de Outubro.
38.º - A EMP09... elaborou o plano de segurança e saúde para a execução da obra em causa o qual foi validado pela e aprovado pela Ré.
39.º - A Ré assegurou a divulgação do plano de segurança e saúde em obra, sendo o mesmo conhecido de todos os trabalhadores.
40.º - No Plano de Segurança e Saúde em obra, foi identificado o risco de queda de objectos/materiais no referido local, conforme Plano Específico de Segurança: “Montagem de Estruturas Pré-Fabricadas para Tabuleiros (Vigas e Pré-Lajes) – OAE’s”.
41.º - A mesma situação é identificada na Ficha de Prevenção de Riscos (FPR 369-A) do Plano, onde consta “Impedir a circulação de pessoas e equipamentos debaixo de cargas suspensas”.
42.º - A Ficha de prevenção de riscos referente à movimentação mecânica de cargas (028-A) refere, entre outras, as seguintes medidas de segurança:
 “Impedir a permanência de trabalhadores na área de manobra dos equipamentos e no raio de ação das cargas”;
 “Deverá garantir-se a correta amarração das cargas a movimentar (…)”
 “Nunca permitir que os trabalhadores se posicionem no raio de ação dos meios mecânicos de elevação e movimentação de cargas ou no trajeto das mesmas”.
43.º - O acesso/circulação na parte da obra em apreço estava condicionado por PMB (Perfis Móveis de Betão), redes Bekaert e sinalização, só havendo entrada com autorização dos encarregados.
44.º - Nos termos da Cláusula 42.2.do Contrato de Subconcessão “A Subconcessionária responderá perante o Concedente e perante terceiros, nos termos gerais da lei, por quaisquer danos emergentes ou lucros cessantes resultantes de deficiências ou omissões na concepção, no projecto, na execução das obras de construção e na Conservação da Via, devendo esta responsabilidade ser coberta por seguro nos termos do numero 73”.
45.º - Em cumprimento da referida disposição legal a Ré EMP03... encontra-se segurada através de contrato de seguro celebrado entre o EMP04... ACE com a Companhia de Seguros EMP06... (com a apólice n.º ...01) através do qual a seguradora assumiu a responsabilidade pelo pagamento de indemnizações devidas, entre outros, pela Ré EMP03..., S. A. a terceiros na sua qualidade de subconcessionária, em resultado da atividade de construção da Autoestrada ..., com o capital seguro por sinistro de 25 milhões de euros.
46.º - O citado contrato segura a atividade da Ré EMP03..., na qualidade de Subconcessionária e Operadora, garantindo “as indemnizações que legalmente sejam exigíveis ao Segurado pelos danos patrimoniais ou não patrimoniais, decorrentes de lesões corporais e/ou materiais no exercício da actividade identificada na apólice, sejam causadas a terceiros por atos ou omissões dos seus legítimos representantes ou das pessoas ao seu serviço e pelas quais seja civilmente responsável”.
47.º -Foi elaborado e executado o Plano Específico de Segurança (“PES”) para Montagem de Estruturas Pré-Fabricadas para Tabuleiros (Vigas e Pré-Lajes) – OAE’s, bem como as Fichas de Prevenção de Riscos FPR023A02 (Movimentação Manual de Cargas) e FPR028A02 (Movimentação Mecânica de Cargas).
48.º - O EMP04... transmitiu à EMP05... a responsabilidade pela sua execução.
49.º - Os mesmos foram integralmente distribuídos à EMP05..., a quem cabia proceder à respectiva divulgação pelos seus colaboradores e subempreiteiros, conforme consta dos Comprovativos de Distribuição, assinados, respectivamente, a 18 de Agosto de 2010 e a 17 de Novembro de 2011, que se dão por integralmente reproduzidos.
50.º - O EMP04... entregou também os mencionados documentos aos seus próprios trabalhadores afectos à obra em referência.
51.º - Para além da referida divulgação obrigatória, todos os trabalhadores afectos à obra em questão foram alvo de formações de acolhimento e específicas, nas quais foram sensibilizados para os vários riscos e precauções envolvidos.
52.º - Houve lugar a diversas formações específicas para a movimentação manual de cargas e para a movimentação mecânica de cargas: em particular, refira-se que os funcionários da EMP05... GG e HH estiveram presentes nas sessões de formação, o primeiro na ocorrida em 19 de Dezembro de 2011 e o segundo nas sessões ocorridas em 19 de Dezembro de 2011 e 30 de Dezembro de 2011.
53.º - O PSS, o PES e as Fichas de Prevenção de Riscos Relativas à Movimentação Manual de Cargas e à Movimentação Mecânica de Cargas foram entregues ao trabalhador sinistrado (Sr. EE), bem como aos trabalhadores envolvidos nos trabalhos de remoção manual dos apoios provisórios (trabalhos que, como vimos, estavam em execução na altura do acidente).
54.º - O trabalhador sinistrado e os trabalhadores que procediam aos trabalhos de remoção manual dos apoios provisórios – assim como todos os restantes – estavam perfeitamente cientes das obrigações decorrentes da necessidade de assegurar, a todo o tempo, o cumprimento do plano de segurança.
55.º - O EMP04... dispunha de pessoal devidamente habilitado que acompanhava regularmente a obra, percorrendo-a nas suas diversas frentes.
56.º - A plataforma de trabalho dispunha de guarda corpos, mas também de rodapés, destinados a evitar a queda de materiais pousados nessa plataforma.
*
Acresce o seguinte facto, que se encontra provado com base no assento de nascimento junto como documento nº ... com o requerimento de intervenção principal espontânea (fls. 1600 do processo físico) e que aqui se adita nos termos das disposições conjugadas dos arts. 607º, nº 4 e 663º, nº 2, do CPC:

57.º - Para além dos filhos referidos em 1.º, EE deixou ainda a filha NN, nascida em ../../2008, a qual é sua filha e de OO.

FUNDAMENTOS DE DIREITO

I – Nulidade da sentença

Dispõe o art. 615º, nº 1, do CPC, (diploma ao qual se referem todas as normas subsequentemente citadas sem menção de diferente origem) que é nula a sentença quando:
a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.

As nulidades da decisão são vícios formais e intrínsecos de tal peça processual e encontram-se taxativamente previstos no normativo legal supra citado.
Os referidos vícios, designados como error in procedendo, respeitam unicamente à estrutura ou aos limites da decisão.
As nulidades da decisão, como seus vícios intrínsecos, são apreciadas em função do texto e do discurso lógico nela desenvolvidos, não se confundindo com erros de julgamento (error in judicando), que são erros quanto à decisão de mérito explanada na sentença, decorrentes de má perceção da realidade factual (error facti) e/ou na aplicação do direito (error juris), de forma que o decidido não corresponde à realidade ontológica ou normativa, com a errada aplicação das normas jurídicas aos factos, erros de julgamento estes a sindicar noutro âmbito (cf. Acórdão desta Relação de 4.10.2018, Relatora Eugénia Cunha, in www.dgsi.pt).
*
As recorrentes EMP06... e EMP03... invocam que a sentença é nula por ter condenado além do pedido.

A nulidade prevista na al. e) do nº 1 do art. 615º, do CPC, decorre da violação dos limites da condenação impostos pelo nº 1 do art. 609º, do CPC, que determina que a sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir.
A nulidade em causa deriva, assim, da conformidade com o princípio da coincidência entre o teor da sentença e o objecto do litígio (a pretensão formulada pelo autor, que se identifica pela providência concretamente solicitada pelo mesmo e pelo direito que será objecto dessa tutela), o qual, por sua vez, constitui um corolário do princípio do dispositivo (art. 3º, nº 1, do CPC)” (Acórdão do STJ, de 8.2.2018, Relatora Maria da Graça Trigo, in www.dgsi.pt).
Como referido no Acórdão do STJ, de 21.3.2019, Relator Oliveira Abreu (in www.dgsi.pt)a nulidade (...) quando o Tribunal condene em objecto diverso do pedido colhe o seu fundamento no princípio dispositivo que atribui às partes a iniciativa e o impulso processual, e no princípio do contraditório, segundo o qual o Tribunal não pode resolver o conflito de interesses, que a demanda pressupõe, sem que a resolução lhe seja pedida por uma das partes e a outra seja chamada para se opor.
A decisão que ultrapassa o pedido formulado, sem modificação objectiva da instância, passando a abranger matéria distinta, está eivada de nulidade prevista na consignada alínea e) do art.º 615º do Código de Processo Civil, pois (...) o Tribunal não pode conhecer, em regra, senão das questões suscitadas pelas partes, não podendo ultrapassar, nem em quantidade, nem em qualidade, os limites constantes do pedido, sendo que não havendo coincidência entre o decidido e o pedido, estar-se-á face a uma extra petição, vício que produz nulidade do aresto”.

Deste modo, face ao princípio do dispositivo que vigora no nosso sistema jurídico, o autor, quando formula o pedido, baliza ou delimita o thema decidendum.
E, por decorrência, o objeto da sentença tem de coincidir com o objeto do processo, não podendo a sentença ir mais além ou ficar mais aquém daquilo que foi pedido. “O pedido do autor, conformando o objeto do processo (...), condiciona o conteúdo da decisão de mérito com que o tribunal lhe responderá: o juiz, na sentença, ‘deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação’, não podendo ocupar-se de outras (art. 608º-2) e ‘não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir’ (art. 609-1)” (Lebre de Freitas e Isabel Alexandre in CPC Anotado, Vol. II, pág. 490).
Mas o pedido tem por base uma determinada causa de pedir, um conjunto de factos nos quais se alicerça a pretensão deduzida, tendo de ser entendido, articulado e interpretado à luz da mesma. Daí que se afirme que “a causa de pedir exerce função individualizadora do pedido para o efeito da conformação do objeto do processo. Por isso o tribunal tem de a considerar ao apreciar o pedido e não pode basear a sentença de mérito em causa de pedir não invocada pelo autor” (Lebre de Freitas e Isabel Alexandre in CPC Anotado, Vol. II, pág. 491).

A recorrente EMP06... considera que a sentença recorrida padece de nulidade na parte em que atribuiu € 20.000,00 ao autor CC, já que resulta da petição inicial - em particular da conjugação dos artigos 31º, 32º, 35º e 37º - que só foi peticionada a indemnização por este dano para os recorridos Viúva e filho BB.
Nada tendo sido alegado e/ou peticionado a título de “falta de contribuição para o sustento” do 3º autor CC, a sentença recorrida, ao atribuir-lhe o valor de € 20.000,00 por perda de alimentos, condenou além do pedido e, como tal, nessa parte, é nula.
Também a recorrente EMP03... invoca a nulidade da decisão com argumentação coincidente, dizendo, nomeadamente que “o Tribunal a quo ao atribuir o valor de 20.000,00 € ao 3.º Autor, por perda de alimentos, condenou as Rés/Recorrentes além do pedido. Em consequência, a sentença recorrida é nula nessa parte, devendo ser revogada a condenação proferida nesse valor que afeta a ora Recorrente”.

O pedido formulado nos presentes autos foi o de condenação solidária das rés a pagar aos autores as quantias discriminadas na p.i., no valor global de € 263 564,89.
Porém, os autores referiram expressamente, no art. 48º da p.i. que, embora tenham discriminado valores parcelares, apenas o fizeram a título exemplificativo e o que pretendem é que o Tribunal arbitre valores indemnizatórios considerando o valor global, e não os valores parcelares.

A decisão recorrida condenou as Rés EMP03..., S. A. e EMP04... ACE a pagar aos Autores, solidariamente, a quantia de € 125 000, 00 e a quantia de € 220 000, 00, deduzida do valor global a pagar pela EMP02..., S.A., no âmbito da conciliação laboral, até ao limite de € 133 564,89.

Confrontando o teor da condenação, no valor total de 258 564,89, atenta a dedução mandada efetuar, com o teor do pedido de condenação, no valor global de € 263 564,89, conclui-se que a condenação se contém dentro dos limites do pedido, não tendo condenado nem em quantidade superior nem em objeto diverso do pedido.
Saber se a sentença recorrida, na parte em que arbitrou € 20 000,00 a título de indemnização ao autor CC, está ou não correta é matéria que releva em sede de apreciação de erro de julgamento, mas não em sede de nulidade.
Por assim ser, não se verifica a nulidade prevista na al. e) do nº 1 do art. 615º.
*
As recorrentes EMP06... e EMP03... invocam que a sentença é nula, nos termos da al. d) do nº 1 do art. 615º por ter conhecido de questão sobre qual não se podia pronunciar.

O excesso de pronúncia ocorre quando o tribunal conhece de questões que não foram suscitadas pelas partes e que não são de conhecimento oficioso.
A nulidade da sentença por excesso de pronúncia, resulta da violação do disposto no n.º 2 do art. 608.º, do CPC, nos termos do qual o juiz não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.
É a violação daquele dever que torna nula a sentença e tal consequência justifica-se plenamente, uma vez que o excesso de pronúncia se traduz na violação do princípio do dispositivo que contende com a liberdade e autonomia das partes.
Deste modo, só haverá nulidade da sentença por excesso de pronúncia quando o julgador tiver conhecido de questões que as partes não submeteram à sua apreciação.

A recorrente EMP06... considera que o tribunal recorrido, ao fundamentar a condenação das Rés/Seguradas no incumprimento do dever de prevenir o perigo previsto no art.º 160.º do Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil e na consequente violação artigos 5.º, n.º 2, e 3, 7.º, alínea a) e 17.º, alínea b), 20.º e 22.º, n.º 1, alínea a), do Decreto-lei n.º 273/2003, na medida em que considerou que não consta dos factos provados que “os trabalhadores tivessem sido advertidos de que não podiam arremessar os aparelhos provisórios directamente ao solo e fossem vigiados para que tal não ocorresse”, incorre na nulidade da sentença por excesso de pronúncia, enquadrável no disposto no artº 615º, nº 1, alínea d), do C.P.C., por ter conhecido de questão sobre qual não se podia pronunciar, porque nunca antes alegada e/ou discutida nos autos, sem previamente ouvir as partes.

Também a recorrente EMP03... invoca a nulidade da decisão com argumentação coincidente, dizendo que o “Tribunal a quo fundamentou ainda a condenação proferida, no incumprimento pela Recorrente, enquanto dona da obra, do dever de prevenir o perigo previsto no artigo 160.º do Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil e na consequente violação artigos 5.º, n.ºs 2 e 3, 7.º, alínea a), e 17.º, alínea b), 20.º e 22.º, n.º 1, alínea a), do Decreto-lei n.º 273/2003, na medida em que considerou que não consta dos factos provados que “os trabalhadores tivessem sido advertidos de que não podiam arremessar os aparelhos provisórios directamente ao solo e fossem vigiados para que tal não ocorresse.
Nem foi igualmente alegado qualquer facto suscetível de justificar o nexo de causalidade entre a mencionada omissão e o acidente que vitimou o Sr. EE.”
Uma vez que, “analisada a petição inicial, em momento algum foi invocado pelos Autores, que a Recorrente tinha o dever de especificar e prevenir no Plano de Segurança e Saúde que os apoios provisórios tinham de ser arriados com cuidado e que era expressamente proibido arremessar diretamente”, conclui que a sentença apreciou questão que não podia apreciar, incorrendo em nulidade por excesso de pronúncia.

Nos presentes autos é pedida uma indemnização com invocação de que o sinistro ocorreu na sequência de violação das regras de segurança no trabalho.
O tribunal recorrido apreciou esta questão, enquadrando a aludida violação na infração do art. 160.º do Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil e na consequente violação dos artigos 5.º, n.º 2, e 3, 7.º, alínea a) e 17.º, alínea b), 20.º e 22.º, n.º 1, alínea a), do Decreto-lei n.º 273/2003.
Face ao disposto nos nºs 1 e 2 do art. 5º, a cognição do tribunal encontra-se limitada aos factos essenciais alegados pelas partes, aos factos instrumentais, complementares ou concretizadores, aos factos notórios e àqueles de que o tribunal tem conhecimento no exercício das suas funções.
Porém, no que concerne a matéria jurídica, o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito, conforme estatuição constante do nº 3 do art. 5º.
Assim, pese embora a violação das regras de segurança no trabalho não tenha sido invocada pelos autores por reporte ao art. 160.º do Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil e à consequente violação artigos 5.º, n.º 2, e 3, 7.º, alínea a) e 17.º, alínea b), 20.º e 22.º, n.º 1, alínea a), do Decreto-lei n.º 273/2003, uma vez que se trata de matéria de direito, à luz do art. 5º, nº 3, o tribunal recorrido podia aplicar tais normas, sem que com isso tenha conhecido de questão de que não podia conhecer. O que sucedeu foi que conheceu a questão que lhe cumpria apreciar, da existência de violação das regras de segurança, com um enquadramento jurídico que não tinha sido considerado nos autos, mas tal era-lhe permitido por força do disposto no art. 5º, nº 3.
Saber se essa decisão é correta e se a factualidade dada como provada a pode validamente sustentar é matéria a sindicar no âmbito da existência de erro de julgamento, e não em sede de nulidade.
Por assim ser, não se verifica a nulidade prevista na al. d) do nº 1 do art. 615º.
*
A recorrente EMP03... invoca que a sentença é nula, nos termos da al. b) do nº 1 do art. 615º, por não especificar os factos não provados.

O vício da sentença decorrente da não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, abreviadamente designado como vício de falta de fundamentação, e previsto na al. b), encontra-se diretamente relacionado com a obrigação de o juiz fundamentar as suas decisões que não sejam de mero expediente, obrigação essa que lhe é imposta pelos arts. 154º e 607º, nºs 3 e 4 e pelo art. 205º, nº 1, da CRP.
A exigência de fundamentação exerce a dupla função de facilitar o reexame da causa pelo tribunal superior e de reforçar o autocontrolo do julgador, sendo um elemento fundamental na transparência da justiça, inerente ao ato jurisdicional (José Lebre de Freitas, in A Ação Declarativa Comum À Luz do Código de Processo Civil de 2013, 3.ª edição, pág. 317).
Impõe-se ao juiz não só que explicite o que decidiu, mas também que indique os motivos que determinaram tal decisão, esclarecendo porque assim decidiu.
Na verdade, só sabendo os concretos fundamentos que justificaram a prolação da decisão as partes terão a possibilidade real e efetiva de proceder à sua impugnação e suscitar a sua sindicância por um tribunal superior. E o tribunal superior só pode sindicar a decisão se conhecer os fundamentos de facto e de direito que lhe subjazem.
Todavia, é entendimento pacífico e consolidado, quer da doutrina, quer da jurisprudência, que só a falta absoluta da indicação dos fundamentos de facto ou de direito será geradora da nulidade em causa, não ocorrendo tal vício nas situações de mera deficiência, insuficiência ou mediocridade de fundamentação.
Assim, como já afirmava o Prof. Alberto dos Reis, (in Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, pág. 140) “há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto. Se a sentença especificar os fundamentos de direito, mas não especificar os fundamentos de facto, ou vice-versa, verifica-se a nulidade”.
Em idêntico sentido, referem Antunes Varela e outros (in Manual de Processo Civil, 2ª edição, p. 687), que, “para que a sentença careça de fundamentação, não basta que a justificação da decisão seja deficiente e incompleta, não convincente; é preciso que haja falta absoluta, embora esta se possa referir só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito”.

A recorrente EMP03... alega que a sentença é nula porque:

- “quanto à matéria de facto dada como não provada, apenas consta da Sentença recorrida o seguinte: “Por se tratar de matéria conclusiva, não se considerou, nem provada, nem não provada, a matéria alegada nos artigos 21.º, 22.º, 23.º, 24.º, 25.º, 26.º, 27.º, 28.º, 32.º, 37.º, 44.º, 45.º, 47.º, 48.º, 49.º, 50.º da petição. | Por falta de prova, não se considerou provada a matéria alegada no artigo 46.º da petição. | Não se considerou a restante matéria alegada nos articulados, por se considerar matéria de impugnação ou não ter interesse para a boa decisão da causa ou constituir matéria conclusiva ou mera repetição da já, entretanto, considerada”;

- a “sentença recorrida, limitou-se a enumerar os factos provados, sem fazer referência aos factos não provados, nomeadamente, os que tenha sido alegados pelas Rés nos seus articulados, não concretizando os meios de prova que determinaram aquela decisão – não podendo julgar-se bastante para dar cumprimento à exigência legal em apreço, a referência genérica feita à “restante matéria alegada nos articulados, por se considerar matéria de impugnação ou não ter interesse para a boa decisão da causa ou constituir matéria conclusiva ou mera repetição da já, entretanto, considerada.

Lendo a sentença recorrida verifica-se que a mesma não procedeu ao elenco autónomo de factos dados como não provados.
Porém, pronunciou-se sobre matéria que julgou não provada, nomeadamente, referindo:
- “pareceu-nos resultar apenas consentânea e parcialmente provada, sob o artigo 2.º dos factos provados, a matéria alegada no artigo 3.º da petição inicial, ou seja que “No dia ../../2012, o referido EE sofreu um acidente [omitindo-se “de trabalho”, por se afigurar conclusivo], quando, em ..., no viaduto sobre a E.N. ...5, no IP..., trabalhava sob as ordens, direção e fiscalização da Ré EMP04..., no exercício das suas funções de carpinteiro de tosco e encarregado, com isenção de horário de trabalho.

- “Por falta de prova bastante (os documentos que os Autores juntaram para prova do alegado – “verso da pág. 26 e pág. 27 da certidão junta como doc. ...3” – não possibilitam uma leitura inequívoca), não se considerou provada parte da matéria alegada no artigo 4.º da petição (“o que sucedeu foi que a retribuição aí considerada foi apenas a que estava transferida para a seguradora da 1ª Ré entidade patronal - Cª de EMP02...“) e a matéria alegada no artigo 5.º (“Todavia, é fáctico que o Sr. EE auferia uma retribuição média mensal líquida não inferior a €1.697”) e 29.º (“O Sr. EE trabalhava para a 1ª Ré ... auferindo uma retribuição anual de cerca de € 21.102,27, com média mensal, por isso, de valor aproximado a € 1.697...”) da petição inicial. Considerou-se apenas provada, sob o artigo 3.º dos factos provados, parte da matéria alegada no referido artigo 4.º da petição, ou seja, que “No âmbito do Proc. 376/12.... do ... Juízo do Tribunal do Trabalho de Penafiel, ficou a constar do auto de conciliação que a vítima auferia o salário de € 965 x 14 + € 124,30 x 11 + 241,25 X 12;”
- “sob o artigo 23.º dos factos provados, parcialmente provada (“À data do óbito, o Sr. EE era saudável, vivia com alegria, que era estimado por familiares e amigos”, a matéria alegada no artigo 38.º da petição”;
- “Por falta de prova, não se considerou provada a matéria alegada no artigo 46.º da petição” (os sublinhados são nossos).

Da transcrição destes excertos da sentença resulta a matéria que foi considerada não provada.
Embora se reconheça que era preferível ter sido utilizada uma diferente metodologia, não misturando a discriminação dos factos considerados não provados com a fundamentação dessa decisão, e antes elencando de forma autónoma os factos considerados não provados, explicando depois os motivos que presidiram a essa tomada de decisão, ainda assim não se pode considerar que a decisão padeça de falta absoluta de fundamentação quanto aos factos não provados, de acordo com o conceito que supra deixámos delineado.

De referir ainda que na sentença não tem necessariamente que haver pronúncia sobre todos os factos que foram alegados nos articulados, em termos de os considerar como provados ou não provados, pois apenas se justifica proferir decisão nesses moldes quantos aos factos relevantes para a decisão a proferir de acordo com as várias soluções plausíveis do ponto de vista do direito, abrangendo os factos constitutivos, impeditivos, extintivos ou modificativos do direito invocado, com exclusão dos factos que não se enquadrem nessas categorias e ainda dos que tenham natureza valorativa ou jurídico-conclusiva.
Daí que se justifique plenamente a afirmação feita na sentença no sentido de que “[p]or se tratar de matéria conclusiva, não se considerou, nem provada, nem não provada, a matéria alegada nos artigos 21.º, 22.º, 23.º, 24.º, 25.º, 26.º, 27.º, 28.º, 32.º, 37.º, 44.º, 45.º, 47.º, 48.º, 49.º, 50.º   da petição” e de que “[n]ão se considerou a restante matéria alegada nos articulados, por se considerar matéria de impugnação ou não ter interesse para a boa decisão da causa ou constituir matéria conclusiva ou mera repetição da já, entretanto, considerada”.

Saber se a decisão é correta e se houve factualidade alegada nos articulados que deveria ter sido dada como provada ou não provada, e não o foi, é matéria a sindicar no âmbito de impugnação da matéria de facto, e não em sede de nulidade.
Por assim ser, não se verifica a nulidade prevista na al. b) do nº 1 do art. 615º.
*
Face ao que se deixou explanado, conclui-se que a sentença não padece dos vícios de nulidade que as recorrentes EMP06... e EMP03... lhe imputam, improcedendo esta questão recursória.

II – Prescrição do direito dos autores

A sentença recorrida apreciou a prescrição invocada, concluindo pela sua improcedência, com a seguinte fundamentação:

Os Réus e Intervenientes invocaram a excepção de prescrição do direito de indemnização dos Autores, alegando que, desde a data em que estes tiveram conhecimento do seu direito e a data das respectivas citações já tinham decorrido mais de três anos.
No entanto, o evento que causou a morte do infeliz EE – arremesso do apoio provisório, do local onde ele se encontrava, para a plataforma, e desta, diretamente para o solo, neste caso, embatendo contra o tejadilho da viatura conduzida pelo EE, amassando-o e fazendo-o ceder/baixar de nível, de forma violenta, contra a cabeça daquele, causando-lhe as lesões descritas no relatório de autópsia, as quais acabaram por lhe provocar a morte – como veremos adiante pelos factos provados, reúne todos os pressupostos do tipo legal de crime previsto no artigo 152.º-B, n.ºs 1, 2 e 4, alínea b), do Código Penal, pelo que o prazo de prescrição é de 10 anos, por efeito do disposto nos artigos 118.º, n.º 1, alínea b), do Código Penal e 498.º, n.º 3, do Código Civil.
Portanto, sem mais extensas, porque desnecessárias, considerações, deverá ser julgada improcedente a alegada excepção de prescrição.

As recorrentes discordam desta decisão e consideram que a situação em apreço não se enquadra no nº 3 do art. 498º, do CC, visto não constituir ilícito criminal, pelo que lhe é aplicável o prazo de prescrição de três anos previsto no nº 1 do mesmo artigo, o qual já decorreu.

De acordo com o art. 498º, nº 1, do CC, o direito de indemnização prescreve no prazo de três anos, a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão integral dos danos, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respetivo prazo a contar do facto danoso.
Porém, de acordo com o nº 3 do mesmo preceito, se o facto ilícito constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo, é este o prazo aplicável.
Portanto, “nos termos do nº 3, o prazo de prescrição será o do procedimento criminal, se o ilícito civil for também um ilícito criminal e aquele for superior a três anos. Esta alteração do prazo de prescrição não depende de o processo penal ter sido ou vir a ser iniciado, mas apenas da qualificação jurídica dos factos” (Ana Prata in Código Civil Anotado, Vol. I, pág. 688, com sublinhado nosso).
No mesmo sentido refere Gabriela Páris Fernandes, em anotação ao art. 498º, do CC, (in Comentário ao Código Civil, Direito das Obrigações, Das Obrigações em Geral, pág. 379) que “não é de exigir, no entanto, segundo entendimento jurisprudencial maioritário, para que se aplique o prazo mais longo da prescrição, que tenha havido prévio procedimento criminal contra o lesante ou condenação penal, assim como não impede a aplicação desse prazo a circunstância de o procedimento criminal ter sido arquivado, de o crime ter sido amnistiado ou de não ter sido exercido tempestivamente o direito de queixa”.

Também “[a] jurisprudência dos tribunais superiores é mais ou menos concordante quanto aos pressupostos da aplicabilidade do Art. 498.º n.º 3 do C.C..
Assim, defende-se geralmente que irreleva para a aplicação do alargamento do prazo prescricional previsto nesse preceito a circunstância de não ter sequer sido apresentada queixa crime para efeitos de início e instauração do correspondente procedimento criminal (neste sentido: Ac. T.R.L. de 16/6/2020 – Proc. n.º 1662/19.0T8PDL.L1-7 – Relatora: Cristina Silva Maximiano; Ac. T.R.G. de 14/5/2015 – Proc. n.º 3533/10.7TJVNF.G1 – Relator: Manuel Bargado; e T.R.E. de 26/5/2022 – Proc. n.º 1071/20.9T8TMR.E1 – Relator: Francisco Xavier). O que releva é apenas que o facto ilícito em causa constitua um crime, para o qual a lei preveja um prazo prescricional mais alargado (cfr. Ac. T.R.P. de 9/11/2021 – Proc. n.º 690/18.8T8ETR.P1 – relatora: Ana Lucinda Cabral; e Ac. T.R.G. de 29/9/2011 – Proc. n.º 481/10.4TbCBT-A.G1 – relatora: Conceição Bucho), não interessando sequer se houve processo-crime ou existência de condenação criminal, não impedindo a ação cível o facto do processo crime ter sido arquivado ou amnistiado (cfr. Ac. T.R.P. der 24/9/2020 – Proc. n.º 532/19.7T8PVZ-A.P1 – relatora: Alexandra Pelayo; Ac. T.R.C. de 28/1/2014 – Proc. n.º 631/09.3TBPMS.C1 – Relatora: Sílvia Pires; e Ac. T.R.E. de 7/4/2022 – Proc. n.º 6902/20.0T8STB.E1 – Relator: Tomé Carvalho)” (acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 8.11.2022, P 635/20.5T8SCR-A.L1-7 in www.dgsi.pt).

Mas, para que se possa aplicar o prazo de prescrição mais longo do ilícito criminal nos termos referidos no art. 498º, nº 3, do CC, não basta que os factos sejam abstratamente integráveis num tipo de ilícito criminal, sendo necessário que a factualidade concretamente provada possa ser subsumida à prática de um ilícito criminal.
Assim, refere-se no acórdão do STJ, de 23.10.2012 (P 198/06.4TBFAL.E1.S1 in www.dgsi.pt) que “[é] óbvio que a aplicação do alargamento do prazo prescricional a que se refere o n.º 3 do preceito em análise, não está dependente de, previamente, ter corrido processo crime, e muito menos da existência de condenação penal, assim como não impede a acção cível, o facto de o processo crime ter sido arquivado, ou amnistiado.
O lesado, apesar disso, pode sempre intentar a acção cível para além do prazo normal de 3 anos, desde que alegue e prove, na acção civil, que a conduta do lesante constitui, no caso concreto, determinado crime, cujo prazo de prescrição é superior aos 3 anos consignados no n.º 1 do preceito.
Tal alegação e prova é pressuposto essencial e necessário da improcedência da excepção de prescrição que o R. tenha suscitado”.

No mesmo sentido se pronuncia o já citado acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 8.11.2022, dizendo que para a aplicação do prazo alargado “é preciso provar que no caso concreto estão preenchidos todos os elementos essenciais do tipo legal de crime em referência, incluindo a culpa efetiva do autor das lesões (cfr. Ac.s do T.R.G. de 22/11/2018 – Proc. n.º 7317/15.8T8GMR.G1 – Relatora Maria Amália Santos; de 28/6/2018 – Proc. n.º 4077/17.1T8GRR.G1; de 8/2/2018 - Proc. n.º 1852/17.0T8GMR.G1 – Relatora: Purificação Carvalho; e Ac.s do T.R.E. de 27/6/2019 – Proc. n.º 2383/18.7T8STR.E1 – relator: Manuel Bragado; e de 8/3/2018 – Proc. n.º 590/17.9T8EVR.E1 – Relator: Mata Ribeiro)”.

Assim, importa apurar se a factualidade dada como provada nos presentes autos constitui ilícito criminal para efeitos de lhe ser aplicável o prazo prescricional mais longo de acordo com o nº 3 do art. 498º.

A decisão recorrida entendeu que a situação é passível de ser integrada no art. 152.º-B, n.ºs 1, 2 e 4, alínea b), do Código Penal.

Dispõe tal preceito que:

1 - Quem, não observando disposições legais ou regulamentares, sujeitar trabalhador a perigo para a vida ou a perigo de grave ofensa para o corpo ou a saúde, é punido com pena de prisão de um a cinco anos, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal.
2 - Se o perigo previsto no número anterior for criado por negligência o agente é punido com pena de prisão até três anos.
3 - Se dos factos previstos nos números anteriores resultar ofensa à integridade física grave o agente é punido:
a) Com pena de prisão de dois a oito anos no caso do n.º 1;
b) Com pena de prisão de um a cinco anos no caso do n.º 2.
4 - Se dos factos previstos nos n.os 1 e 2 resultar a morte o agente é punido:
a) Com pena de prisão de três a dez anos no caso do n.º 1;
b) Com pena de prisão de dois a oito anos no caso do n.º 2.


O crime de violação de regras de segurança configura um crime de perigo concreto (visto que pressupõe a sujeição do trabalhador a uma situação de perigo concreto para a vida, o corpo ou a saúde, com violação das disposições legais ou regulamentares vigentes à data do facto), de resultado (pois a sua consumação exige a "(efetiva) «sujeição" do trabalhador à realização da atividade fora das indispensáveis condições de segurança», embora não exija a lesão dos bens jurídicos tutelados) específico próprio (segundo a qualidade dos autores), omissivo próprio (omissão de um dever de agir e independente do resultado) e de violação de dever” (acórdão da Relação do Porto, de 23.6.2021, P 646/17.8GBOAZ.P1 in www.dgsi.pt).

Percorrendo a factualidade provada verifica-se que a morte de EE ocorreu por ter sido atingido por um apoio provisório de betão que caiu em cima da viatura em que circulava, no circunstancialismo descrito nos factos 6, 7 e 8.
Decorre do descrito nos factos 9 a 16 e em especial dos factos 17 e 18 que o apoio provisório foi arremessado pelos trabalhadores que procediam à sua remoção diretamente da plataforma para o solo.
Portanto, decorre da descrita factualidade que o apoio provisório apenas caiu porque os trabalhadores que o estavam a remover o arremessaram diretamente para o solo de uma altura de cerca de 35 metros, sendo certo que se tratava de um apoio em betão, de dimensões consideráveis (75 cm de comprimento e 40 cm de altura) e com 150 Kg de peso. Tal queda não teria ocorrido se os trabalhadores não tivessem procedido ao seu arremesso e tivessem executado a remoção com recurso à grua, como estava previsto, sendo que se provou que a deslocação do local onde o apoio estava posicionado até ao pavimento da plataforma constituía tarefa simples e sem qualquer risco, se efetuada com observância das regras a que tal trabalho estava sujeito (facto 16).
Mas estas regras não foram observadas pelos trabalhadores, os quais arremessaram o apoio provisório, com 150 kg de peso, de uma altura de 35 metros diretamente para o solo.
Assim, conclui-se que o facto ilícito que ocasionou a morte de EE consistiu no arremesso do apoio provisório que foi levado a cabo pelos trabalhadores, em violação das regras de segurança mais básicas e elementares pois, para qualquer pessoa dotada do mais elementar bom senso, resulta evidente que atirar de uma altura de 35 metros um objeto com as dimensões referidas e com 150 kg de peso é extremamente perigoso dada a possibilidade de vir a atingir pessoas ou objetos, causando-lhes graves danos.
Este ato ilícito não foi cometido pelas rés, mas sim pelos referidos trabalhadores que procederam ao arremesso do apoio.
Não resulta da factualidade provada que tenha sido por qualquer indicação das rés que a remoção do apoio foi feita por arremesso direto para o solo ou que estas tenham contribuído de alguma forma para que os trabalhadores em questão tenham tido tal comportamento.
No que toca a regras de segurança e saúde quanto à execução da obra em causa, provou-se que:
37.º - No âmbito da referida Subconcessão, a Ré contratou também a EMP09..., S. A., para realizar a fiscalização em obra, tendo nomeado tal empresa como coordenador em matéria de segurança e saúde durante a realização da obra nos termos e para os efeitos previstos no Decreto-Lei n.º 273/2003, de 29 de Outubro.
38.º - A EMP09... elaborou o plano de segurança e saúde para a execução da obra em causa o qual foi validado pela e aprovado pela Ré.
39.º - A Ré assegurou a divulgação do plano de segurança e saúde em obra, sendo o mesmo conhecido de todos os trabalhadores.
40.º - No Plano de Segurança e Saúde em obra, foi identificado o risco de queda de objectos/materiais no referido local, conforme Plano Específico de Segurança: “Montagem de Estruturas Pré-Fabricadas para Tabuleiros (Vigas e Pré-Lajes) – OAE’s”.
41.º - A mesma situação é identificada na Ficha de Prevenção de Riscos (FPR 369-A) do Plano, onde consta “Impedir a circulação de pessoas e equipamentos debaixo de cargas suspensas”.
42.º - A Ficha de prevenção de riscos referente à movimentação mecânica de cargas (028-A) refere, entre outras, as seguintes medidas de segurança:
 “Impedir a permanência de trabalhadores na área de manobra dos equipamentos e no raio de ação das cargas”;
 “Deverá garantir-se a correta amarração das cargas a movimentar (…)”
 “Nunca permitir que os trabalhadores se posicionem no raio de ação dos meios mecânicos de elevação e movimentação de cargas ou no trajeto das mesmas”.
43.º - O acesso/circulação na parte da obra em apreço estava condicionado por PMB (Perfis Móveis de Betão), redes Bekaert e sinalização, só havendo entrada com autorização dos encarregados.
47.º -Foi elaborado e executado o Plano Específico de Segurança (“PES”) para Montagem de Estruturas Pré-Fabricadas para Tabuleiros (Vigas e Pré-Lajes) – OAE’s, bem como as Fichas de Prevenção de Riscos FPR023A02 (Movimentação Manual de Cargas) e FPR028A02 (Movimentação Mecânica de Cargas).
48.º - O EMP04... transmitiu à EMP05... a responsabilidade pela sua execução.
49.º - Os mesmos foram integralmente distribuídos à EMP05..., a quem cabia proceder à respectiva divulgação pelos seus colaboradores e subempreiteiros, conforme consta dos Comprovativos de Distribuição, assinados, respectivamente, a 18 de Agosto de 2010 e a 17 de Novembro de 2011, que se dão por integralmente reproduzidos.
50.º - O EMP04... entregou também os mencionados documentos aos seus próprios trabalhadores afectos à obra em referência.
51.º - Para além da referida divulgação obrigatória, todos os trabalhadores afectos à obra em questão foram alvo de formações de acolhimento e específicas, nas quais foram sensibilizados para os vários riscos e precauções envolvidos.
52.º - Houve lugar a diversas formações específicas para a movimentação manual de cargas e para a movimentação mecânica de cargas: em particular, refira-se que os funcionários da EMP05... GG e HH estiveram presentes nas sessões de formação, o primeiro na ocorrida em 19 de Dezembro de 2011 e o segundo nas sessões ocorridas em 19 de Dezembro de 2011 e 30 de Dezembro de 2011.
53.º - O PSS, o PES e as Fichas de Prevenção de Riscos Relativas à Movimentação Manual de Cargas e à Movimentação Mecânica de Cargas foram entregues ao trabalhador sinistrado (Sr. EE), bem como aos trabalhadores envolvidos nos trabalhos de remoção manual dos apoios provisórios (trabalhos que, como vimos, estavam em execução na altura do acidente).
54.º - O trabalhador sinistrado e os trabalhadores que procediam aos trabalhos de remoção manual dos apoios provisórios – assim como todos os restantes – estavam perfeitamente cientes das obrigações decorrentes da necessidade de assegurar, a todo o tempo, o cumprimento do plano de segurança.
55.º - O EMP04... dispunha de pessoal devidamente habilitado que acompanhava regularmente a obra, percorrendo-a nas suas diversas frentes.
56.º - A plataforma de trabalho dispunha de guarda corpos, mas também de rodapés, destinados a evitar a queda de materiais pousados nessa plataforma.

Desta factualidade extrai-se a conclusão de que as rés identificaram os riscos inerentes à atividade a desenvolver e tomaram as medidas necessárias para prevenir acidentes decorrentes da concretização dos riscos identificados.

O acidente não ocorreu por as rés terem inobservado disposições legais ou regulamentares, sujeitando, desse modo e como consequência dessa inobservância, o trabalhador a perigo para a vida ou a perigo de grave ofensa para o seu corpo ou saúde, conforme previsão do art. 152º-B, nº 1, do CP, mas sim porque os trabalhadores procederam ao arremesso do apoio provisório diretamente para o solo de uma altura de 35 metros, tendo atuado de forma contrária às regras de segurança implementadas, sendo que a deslocação do apoio do local em que se encontrava posicionado até ao pavimento da plataforma, constituía tarefa simples e sem qualquer risco, se efetuada com observância das regras a que tal trabalho estava sujeito (facto 16º).
Por isso, ainda que não esteja provado que o risco prevenido no artigo 160.º do Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil (“O material dos andaimes, as peças das máquinas e quaisquer outros objectos serão arriados com cuidado e nunca arremessados directamente”) foi especificado e prevenido no plano de segurança ou em outros actos securitários das empresas que executavam trabalhos na obra (empreiteira e subempreiteira) e que desse risco tivessem sido avisados os trabalhadores que procederam à remoção dos aparelhos provisórios, advertindo-os de que estes tinham de ser arriados com cuidado e nunca arremessados diretamente - situação esta em que a sentença recorrida se baseia para considerar que existe violação de normas legais - daí não decorre que foi essa situação que sujeitou o trabalhador a perigo para a vida ou a perigo de grave ofensa para o corpo ou a saúde. O perigo para a vida e saúde do trabalhador não foi criado pelo incumprimento por parte das rés do dever de avisarem os trabalhadores de que não podiam arremessar objetos diretamente para o chão e de os vigiar para não o fazerem, mas antes do incumprimento por parte dos trabalhadores, que não executaram a tarefa nos termos previstos, a qual era simples e não oferecia risco, e resolveram arremessar o apoio para o chão.
Tanto mais que, como já supra referido, resulta dos factos 37 a 43 e 47 a 56 que foi contratada a EMP09... para realizar a fiscalização em obra como coordenadora em matéria de segurança e saúde, entidade que elaborou o plano de segurança e saúde, no qual foi identificado o risco de queda de objetos/ materiais, situação que foi identificada na ficha de prevenção de riscos; foram também identificadas, nas fichas de prevenção de riscos, a movimentação manual e mecânica de cargas; foi dado conhecimento aos trabalhadores mediante entrega dos respetivos documentos e os mesmos, além disso, tiveram formações de acolhimento e específicas, onde foram sensibilizados para os vários riscos e precauções em geral e especificamente para a movimentação manual e mecânica de cargas, sendo que o EMP04... dispunha de pessoal devidamente habilitado que acompanhava regularmente a obra, percorrendo-a nas suas diversas frentes.

Por conseguinte, consideramos que não decorre da factualidade provada que as rés, em inobservância de disposições legais ou regulamentares, tenham tido qualquer comportamento que tenha sujeitado o trabalhador a perigo para a vida ou a perigo de grave ofensa para o corpo ou a saúde, pelo que a sua atuação não pode ser enquadrada no crime previsto no art. 152º-B, do CP.

Por assim ser, não tem aplicação o prazo prescricional previsto para o ilícito criminal de acordo com o nº 3 do art. 498º do CC, mas sim o prazo de três anos previsto no nº 1 do mesmo preceito.
O acidente ocorreu em ../../2012, pelo que o prazo de três anos terminou em 25.5.2015.
A ação foi proposta em 19.1.2017, altura em que o prazo de três anos já se tinha completado, pelo que resta concluir que o direito de indemnização se encontra efetivamente prescrito, tal como defendido pelas recorrentes.

O que significa que procede esta questão recursória, tendo a sentença que ser revogada na parte em que absolveu os autores da exceção de prescrição e na parte em que condenou as rés no pagamento de indemnização acrescida de juros e as absolveu do demais peticionado.
Consequentemente, a condenação em custas na ação também tem que ser alterada, ficando as mesmas a cargo dos autores.
*
A conclusão de que o direito dos autores se encontra prescrito prejudica o conhecimento das restantes questões recursórias.
*
Nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 527.º, do CPC, a decisão que julgue o recurso condena em custas a parte que a elas houver dado causa, entendendo-se que lhes deu causa a parte vencida, na respetiva proporção, ou, não havendo vencimento, quem do processo tirou proveito.
Tendo o recurso sido julgado procedente, com a revogação da decisão de mérito, são os recorridos responsáveis pelo pagamento das custas, em conformidade com a disposição legal citada.

DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar as apelações procedentes e, em consequência, revogam a sentença recorrida, na parte em que absolveu os autores da exceção de prescrição e na parte em que condenou as rés no pagamento de indemnização acrescida de juros e as absolveu do demais peticionado, e declaram procedente a exceção de prescrição do direito dos autores deduzida pelas rés/recorrentes e, consequentemente, absolvem as rés do pedido contra si formulado.
As custas da ação e dos recursos ficam a cargos dos autores.
Notifique.
*
Sumário (da responsabilidade da relatora, conforme art. 663º, nº 7, do CPC):

I – O prazo de prescrição para exercício do direito de indemnização é de três anos, conforme estabelecido no art. 498º, nº 1, do CC.
II – Porém, se o facto ilícito constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo, é este o prazo aplicável (art. 498º, nº 3, do CC), não dependendo esta extensão do prazo de prescrição de o processo penal ter sido, ou vir a ser, iniciado ou de ter sido arquivado, de o crime ter sido amnistiado, ou de não ter sido exercido tempestivamente o direito de queixa.
III - Mas, para que se possa aplicar o prazo de prescrição mais longo do ilícito criminal nos termos referidos no art. 498º, nº 3, do CC, não basta que os factos sejam abstratamente integráveis num tipo de ilícito criminal, sendo necessário que a factualidade concretamente provada possa ser subsumida à prática de um ilícito criminal.
IV – Uma vez que a factualidade provada no caso concreto não permite subsumir a conduta das rés à prática de qualquer ilícito criminal, designadamente do crime de violação de regras de segurança previsto no art. 152º-B, do Código Penal, o prazo de prescrição aplicável é o de três anos, previsto no nº 1 do art. 493º do Código Civil, e não o prazo alargado previsto no nº 3 do mesmo normativo.
*
Guimarães, 18 de abril de 2024

(Relatora) Rosália Cunha
(1º/ª Adjunto/a) Lígia Paula Ferreira de Sousa Santos Venade
(2º/ª Adjunto/a) Maria João Marques Pinto de Matos